Politólogo, Mestre em Ciência Política pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa

Eutanásia, trafulhices e vigarices

Há inflação para todos menos para quem trabalha e usufrui dos serviços em cuidados continuados, situação que provoca um grave subfinanciamento e que já levou a que em dois anos encerrassem 207 camas.

A Eutanásia foi, mais uma vez, aprovada no Parlamento. Muitas pessoas já abordaram este assunto (e ainda é tema e continuam a falar nele), algumas das quais mais conhecedoras da matéria pelo que não me vou alongar, apenas acrescentar algo ao debate que, julgo, a maioria desconhece. Sabiam que nos últimos anos, a taxa de ocupação de camas em Paliativos da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) anda na ordem dos 50%? Inclusive durante a pandemia, quando diziam não haver camas disponíveis nos hospitais? E sabiam que é dito às famílias e doentes (muitas vezes exercendo uma enorme pressão) que têm de ir para casa pois nem em paliativos nem nas outras tipologias da RNCCI há vagas e a lista de espera é enorme? Estranho, não é? Porque será? Já tive oportunidade de denunciar esta situação nos órgãos próprios, nomeadamente na Comissão de Saúde da Assembleia da República. Mas parece que ninguém se preocupa com estas situações de enorme gravidade, nem mesmo a comunicação social lhe dá a atenção que merece.

Mas há mais, infelizmente. Com a publicação da Portaria 272/2022, veio ser reposta justiça (pensaríamos todos), uma vez que, basicamente, no caso dos doentes encaminhados para a tipologia de longa duração e que tenham úlceras de pressão (vulgo escaras/feridas abertas no corpo), estas úlceras passam a ser pagas independentemente da origem do doente (pois antes só eram pagas se fossem provenientes de um hospital público, caso tivessem outra proveniência estes doentes eram tratados de borla). No entanto há um senão: é que a administração pública (quem deu a ordem?) já há vários meses que envia estes doentes para a tipologia de média duração, de forma a que os doentes sejam tratados gratuitamente, o que é naturalmente grave. Como se isto não bastasse, estes doentes que não têm potencial de reabilitação, estão a tirar a vaga a quem tem esse potencial e que sai gravemente prejudicado (que para além do sofrimento pessoal e de ficarem dependentes de outros, sem a sua própria autonomia, por lhes ser vedada a sua reabilitação, são mais pessoas que vêm aumentar os custos em saúde e pensões por invalidez). Portugal é mesmo um dos campeões do causar sofrimento e gastar dinheiro estupidamente.

Recentemente, o Senhor Ministro da Saúde, em entrevista, reconheceu que têm de se actualizar os preços que o Estado paga pelos medicamentos. O Sr. Secretário de Estado João Galamba referiu que o Governo iria actualizar os preços a pagar pelas energias renováveis para serem atractivos. As PPP rodoviárias reclamam actualizações com base na inflação (que sempre foram cumpridas) e o Senhor Primeiro-Ministro diz que tal não é possível mas todos sabemos como acaba – o Governo a pagar generosamente. E o que nos diz então a mesma portaria 272/2022? Que em 2023 não haverá actualização dos preços dos cuidados continuados com base na inflação do ano anterior (2022). Ou seja, há inflação para todos menos para quem trabalha e usufrui dos serviços em cuidados continuados. Inacreditável. Os preços dos cuidados continuados entre 2011 e 2022 apenas foram actualizados por duas ocasiões (a última das quais nesta portaria que referi), situação que provocou e provoca um grave subfinanciamento deste sector e que já levou a que em 2 anos encerrassem 207 camas que tanta falta fazem ao SNS.

Em 2017 e 2018 o Governo contratualizou com os representantes do sector social aumentos para os cuidados continuados. Não cumpriu. Em 2021 acordou aumento de 6% para a tipologia de Longa Duração, mas aumentou apenas 4,9%.

O terceiro sector, como já escrevi noutras ocasiões, está 99% dependente das decisões do Governo. Este, com o dinheiro dos impostos de todos nós, dota os orçamentos dos diversos ministérios com os recursos necessários para fazer face ao aumento da inflação (do qual beneficia mais, pois retira mais recursos aos cidadãos e empresas) e aumenta os funcionários públicos de forma significativa para que não percam “poder de compra”. Para o terceiro sector os aumentos propostos cobrem o salário mínimo e o que sobra não chega nem para aumentar salários aos restantes trabalhadores, nem para cobrir o exponencial aumento de custos de bens e serviços por força da inflação. O Senhor Primeiro-Ministro quer que um jovem licenciado entre para uma empresa a ganhar 1.320€ mensais brutos. Mas não se importa que numa IPSS esse mesmo jovem licenciado entre a ganhar 735€ brutos (Técnico de Educação Especial e Reabilitação), ou 785€ brutos (como é o caso de um fisioterapeuta, terapeuta da Fala ou terapeuta Ocupacional). E também não o choca que o salário mais elevado da tabela de uma IPSS seja o de director, cujo salário bruto mensal é de 1.244€, bem inferior aos 1.320€ do tal jovem licenciado. E está nas mãos do Primeiro-Ministro fazer diferente e criar mais justiça e igualdade para quem trabalha neste sector e que também presta um serviço público. Mas não, faz exactamente o aposto e cria ainda mais desigualdade. É como se a função pública oficial fosse uma casta superior e a função pública não oficial (das IPSS) seja uma casta inferior.

O objectivo deste artigo, e os factos nele descrito, pretendem denunciar uma pequeníssima parte da falta de democracia que existe em Portugal (mais parece de um Estado totalitário), das prioridades do Governo e de boa parte da Assembleia da República, para quem a morte é a prioridade, ao invés de ser os cuidados de saúde a quem está vivo, ou tirar sofrimento a quem está em fim de vida. Igualmente, Governo e Administração Pública não entendem que de tanto querer poupar dinheiro infligindo sofrimento a uma parte da população, acabam por infligir tanto ou mais sofrimento e gastar ainda mais dinheiro do que aquele que pretendem poupar.

Onde está a igualdade entre cidadãos? O respeito e o cumprimento pela lei? A designada Rule of Law? A Comunicação social e comentadores políticos enchem a boca com a Hungria. Cada vez que os oiço falar da Hungria parece que estou a ouvir uma descrição de Portugal. Aqui está tudo bem mas na Hungria está tudo mal.

Quem nos acode destas vigarices, trafulhices e da falta de democracia?

https://www.jose-bourdain.com/wp-admin/post.php?post=806&action=edit

Debate sobre o Terceiro Sector (5)

No primeiro artigo sobre este tema ‘Debate sobre o Terceiro Sector’, comecei por explicar o modelo de funcionamento e o seu enquadramento legal. Neste artigo irei abordar a forma como funciona este sector no seu relacionamento com o Governo e a Administração Pública.

Num País supostamente democrático (e Portugal já o foi mais – segundo organizações internacionais que monitorizam estas coisas) é presumível existir igualdade entre cidadãos e instituições e estarmos todos ao mesmo nível. No entanto, em Portugal, não é assim. Os Governos, e este em particular, comportam-se de forma autoritária, sem respeito pelas instituições.

O que tenho verificado ao longo de quase 35 anos de trabalho nesta área, é que os políticos, regra geral, não entendem nada do terceiro sector, e em vez de se rodearem de pessoas que entendam, regra geral também é o oposto, ou seja, rodeiam-se de pessoas que não sabem nada (nem deste sector e na maioria dos casos de coisa nenhuma).

Quando estas pessoas nos ouvem (o que é raro), é como se falássemos para uma parede tal é a falta de conhecimento. Naturalmente que depois não é possível tomar boas decisões: pensar, planear, agir bem, procurar melhorar aquilo que está mal e que funciona deficitariamente.

O relacionamento do terceiro sector com a Administração Pública não é fácil. No geral, os serviços públicos funcionam mal, não cumprem prazos, são excessivamente burocráticos e por vezes impedem cidadãos e organizações de prosseguir a sua normal actividade apenas e só por desconhecimento: É a velha máxima – cada funcionário público, cada autoridade, age consoante o que lhe vai na mente e não de acordo com o quadro legal vigente; o designado pequeno poder.

Isto tem consequências enormes para o País e, na minha opiniãoé a Administração Pública o maior entrave ao crescimento e desenvolvimento económico e social do País. Não quero ser injusto, naturalmente sei que há muitos funcionários públicos zelosos e bons trabalhadores que se preocupam, mas infelizmente é uma minoria.

Acresce a isto que a Administração Pública trata as organizações do terceiro sector de “cima para baixo”, isto é, como se exercessem algum tipo de autoridade sobre nós e tivéssemos que lhes obedecer. Mais uma vez não quero generalizar pois felizmente há muitas excepções, mas é assim no dia-a-dia e destaco em particular pela negativa a área da saúde.

Como referi, a Administração Pública, ao invés de aplicar o simplex e descomplicar, aplica o complex e só complica. Ficam aqui apenas alguns exemplos para que possamos todos reflectir e para o Governo e Administração Pública resolver:

  1. Uma IPSS adquire uma viatura para transporte de pessoas em cadeiras de rodas. A viatura chega, é transformada em oficina própria. Está pronta “chave na mão”. Mas para que possa circular é necessário uma inspecção extraordinária a qual em Lisboa demora 1 ano – inaceitável. Solução: ir a Viseu ou Aveiro cuja espera é de “apenas” 3 a 4 meses (igualmente inaceitável mas melhor do que 1 ano à espera).
  2. Há falta de Creches em Portugal. Constrói-se um edifício para Creche (ou outro equipamento social importante). A obra está concluída e é preciso a licença de utilização da Câmara Municipal. Mas para tal, entre outras coisas, é preciso uma vistoria da Autoridade Nacional de Protecção Civil. 2 anos à espera no distrito de Lisboa (inaceitável)
  3. É preciso construir um equipamento social e vamos junto de um qualquer município pedir uma informação prévia para atestar a viabilidade de construção. Devido a estar próximo de uma linha de água é necessário um parecer da Agência Portuguesa do Ambiente. 1 ano à espera. Inaceitável.
  4. Ainda relativamente àinformação prévia ou já na fase de aprovação da arquitectura, os serviços públicos em geral não cumprem os prazos relativamente aos pareceres que têm de formular. A legislação permite o deferimento tácito para que os projectos tenham a sua continuidade e não existam mais atrasos. Os municípios não cumprem e querem na mesma os pareceres independentemente de demorarem 1 ou 3 anos. Inaceitável.
  5. Uma IPSS precisa de um parecer favorável sobre um projecto de arquitectura para um equipamento social. Um arquitecto dá um parecer favorável. Outro arquitecto dá um parecer desfavorável. O projecto é o mesmo e a legislação a mesma. Acontece com demasiada frequência. Mas a criatividade do ser humano é gigante e o mesmo arquitecto que dá um parecer favorável sobre um projecto e que ao fim de 2 anos esse parecer tem de ser renovado dá agora um parecer desfavorável sobre o mesmo. Nestes 2 anos a legislação não foi alterada. O que explica este comportamento? Inaceitável.
  6. No Programa PARES uma IPSS não consegue lançar concurso público sem o parecer da Segurança Social. Motivo frequente para que nada avance? A falta de uma data numa minuta de uma reunião, além de assinaturas. Gera-se um impasse. Então que data se coloca numa minuta? Bem, uma minuta é uma minuta (é suposto ter a data quando a reunião ocorrer e o espaço da data na minuta ficar em branco) mas há quem não saiba o que isso é. E assinar uma minuta? Bem… na vez anterior não foi exigido isso. Mas agora já é. Porque apetece. Vem na lei? Mas qual lei? Sem comentários.

No entanto… Ai da organização ou do cidadão que não cumpra prazos ou não pague o que quer que seja dentro dos prazos. Na Administração Pública tudo é possível: não cumprir prazos, não pagar a tempo e horas, inventar normas nos dias e horas em que apetece apenas e só porque… lhes apetece.

Cidadãos e empresas estão completamente desprotegidos face a esta tirania e viver em Portugal, não sendo bem o Inferno, pois esse, infelizmente, é o que vivem certos países altamente democráticos no mundo que sofrem guerras e privações como é o caso do Iêmen ou da Coreia do Norte para dar um exemplo de cada. Mas que este nosso País é um verdadeiro purgatório, lá isso é.

A maioria dos funcionários públicos, infelizmente, não entende que se facilitar (não confundir com ilegalidades, não é disso que se trata) a vida às empresas e cidadãos, que se trabalharem mais e melhor, o País tem mais crescimento económico, enriquece e por sua vez vai traduzir-se em melhores salários e regalias para eles próprios. Mas preferem complicar e infernizar a vida daqueles que trabalham para precisamente sustentar o modo de vida deles.

Não se entende porque razão há cada vez mais funcionários públicos, mas os serviços pioram. Como é possível? Todos reconhecem que a vacinação para a covid correu bem. Mas foi feita por marcianos? Ou pelos mesmos que trabalham todos os dias na Administração Pública? Então uma das coisas que faz falta,provavelmente, é liderança e organização. E se calhar, também, há gente dos partidos a mais na Administração Pública.

Sinceramente gostava que Governos e Administração Pública reflectissem e mudassem de vida para que Portugal pudesse, como um todo, mudar também, mas para melhor, pois infelizmente tem piorado a todos os níveis conforme é possível verificar nos mais diversos indicadores europeus e mundiais ao nível económico e social. Inaceitável.

Por José Bourdain, Presidente da ANCC

Debate sobre o Terceiro Sector (4)

Começo como terminei o artigo anterior: O que quer o Governo para este sector?

O discurso oficial, sobretudo dos três protagonistas do Governo que directamente tutelam o sector social (onde se inclui os cuidados continuados), ou seja, o Primeiro-Ministro, o Ministro da Saúde e a Ministra da Segurança Social, salientam que é um sector fundamental para o País, que contam com o sector para crescer e investir mais em novos equipamentos sociais, na reabilitação e transformação de edifícios para adaptar a novas vagas, ou seja, mais e melhor apoio social para colmatar as lacunas existentes.

O ano passado, renovou-se o Pacto Social (existente há 25 anos) entre o Governo e o Terceiro Sector, em que o Primeiro-Ministro reforça precisamente que conta com o sector, que pretende chegar ao pagamento de pelo menos 50% dos custos das diversas respostas sociais e que pretende a valorização salarial dos profissionais. No entanto, faz exactamente o aposto:

  1. Em 2021 mas também em 2022, teve uma oportunidade cabal para fazer um avanço no sentido de chegar aos 50% de comparticipação nos custos das várias respostas sociais e no entanto não o fez. Os aumentos nos acordos de cooperação foram insuficientes e nem sequer fizeram face aos aumentos de custos, nomeadamente com o salário mínimo. No caso dos cuidados continuados, em 2021, das 4 tipologias só houve aumento em uma (Longa Duração) e ao invés de aumentar em 6% tal como acordado, apenas aumentou 4,9%. Em 2022 os aumentos foram insuficientes e, pasme-se, a Portaria diz que em 2023 não haverá aumentos com base na inflação de 2022, isto é, o Governo assume que há inflação para todos os portugueses menos para aqueles que trabalham e beneficiam dos serviços em cuidados continuados. Neste terceiro sector o Governo poupa imenso mas para as parcerias público-privadas rodoviárias vão haver aumento de mais de 10%. Neste caso já não faz poupança, paga bem pago com os impostos de todos nós.
  2. Quanto à valorização salarial prometida, mais uma vez, o Governo ao não aumentar de forma justa os valores a pagar a este sector, não permite que os salários de todos os trabalhadores subam de forma razoável e justa. É de uma enorme hipocrisia este discurso como é também o discurso do Primeiro-Ministro de querer que as empresas paguem 1.320€ a um jovem licenciado quando nas IPSS o salário de um jovem licenciado é de 735€ (nível 10, Técnico de Reabilitação) ou de 785€ (nível 9, Fisioterapeuta, Terapeutas daFala e Ocupacional).
  3. O Governo não cumpre a legislação que produz nem os contratos que assina. É assim desde 2015 com a legislação dos cuidados continuados e com os vários compromissos do sector social.
  4. O PARES e o PRR são um engano para as IPSS pois prometem comparticipações de 80% e 100% respectivamente mas sobre um valor m2 de pouco mais de 600€, quando a realidade é o custo m2 entre 1.500€ e 1.600€ a que acresce 50% do IVA (23%). Na prática isto faz com que o financiamento a fundo perdido seja entre 25% a 30%. Esta situação leva a que muitas das IPSS que concorreram já estejam a desistir, desaproveitando assim fundos comunitários e perdendo a oportunidade de colmatar as lacunas neste sector e respectiva criação de emprego. Assunto à atenção do Sr. Presidente da República. Neste caso (e em todos os outros também) pergunto-me se é incompetência ou é propositado colocar valores insuficientes no PARES e PRR na mesma lógica das cativações com que o Governo controla os défices das contas públicas. Eu diria que são ambas as coisas e a incompetência demonstra-se, por exemplo, quando no PRR se inscreve 35.695€ por cama em ERPI e 30.000€ por cama em cuidados continuados sabendo-se perfeitamente que as exigências de construção dos cuidados continuados são muito superiores, logo mais caras, aos mais diversos níveis, nomeadamente na instalação de gases medicinais hospitalares, os quais são caríssimos.

Nos últimos anos e em especial em2021 e 2022, o resultado destas políticas tem sido o encerramento de organizações (por insolvência ou simplesmente encerram e desistem) e outras optam por encerrar valências para não arrastarem a totalidade da organização para uma situação crítica. A cada semana que passa chega-me ao conhecimento diversos exemplos de enceramentos totais ou parciais, na área dos idosos, na deficiência e nos cuidados continuados.

Neste último caso encerraram 207 camas e não é coincidência noRelatório de Avaliação de Desempenho e Impacto do Sistema de Saúde (RADIS) que saiu há dias constar que a taxa de aumento da lista de espera para cuidados continuados foi de 88%, isto apesar das dificuldades que são criadas aos utentes e famílias para acesso à Rede de Cuidados Continuados.

Ou seja, como demonstrei, apesar do discurso/propaganda do Governo de apoio e elogios ao sector, na prática o Governo persegue, sacrifica e castiga o terceiro sector, eu diria mesmo que há maldade nos seus actos ao que acresce o facto de não cumprir os contratos que assina (compromisso sector social) nem a legislação que produz.

Esta conduta persecutória leva a que não haja confiança no Governo e que os poucos ingénuos que ainda confiam, estão a deixar de o ser e a cair na realidade que os faz sofrer diariamente e os leva a tomar medidas drásticas numa tentativa de sobrevivência (a qual não irá durar muito mais tempo, estou, infelizmente, certo). Neste quadro, investir é extremamente difícil, desistir e mudar de vida são os caminhos mais fáceis, o que infelizmente tem acontecido cada vez com mais frequência.

Seria importante, fundamental, que o Governo de forma transparente e séria dissesse o que quer para este sector: se quer continuar com este modelo (seja tal como ele existe hoje ou descentralizado nos municípios), se quer nacionalizar (e manter o controlo directo ou passar para a gestão dos municípios). O correcto seria um debate transversal à sociedade sobre este tema mas admito que não havendo, que se tome uma decisão seja ela qual for. Se é para continuar como está então há que pagar o justo valor para que se possa fazer um trabalho digno, de qualidade, cumprindo o quadro legal a que as IPSS estão obrigadas e remunerar adequadamente quem nele trabalha.

Como está é que não pode continuar pois sem dinheiro, sem trabalhadores e dos poucos que há a maioria não tem vocação nem formação, será difícil manter padrões de qualidade no serviço prestado. Depois acontece algum caso de negligência e lá vem o dedo acusador da Comunicação Social e do Governo, quando é este último o principal causador domau funcionamento.

Senhor Primeiro-Ministro, diga lá o que pretende fazer com este sector, seja isso o que tiver de ser, mas faça algo e siga em frente. Como está é que não pode continuar.

Por José Bourdain, Presidente da ANCC

Debate sobre o Terceiro Sector (3)

Então e qual o Estado actual “da arte”? Como está a saúde deste sector? Para onde vai? Como se têm comportado os Governos nos últimos anos.

Vou cingir-me apenas ao período imediatamente anterior ao daTroika para cá, por forma a não me alongar demasiado.

No Governo de José Sócrates foi dado um forte impulso na construção de novos equipamentos sociais através do Programa PARES e o discurso do Governo PS era o de apostar neste modelo de cooperação com o Terceiro sector.

No Governo de Passos Coelho continuou a existir essa continuidade de modelo e evoluiu para o discurso de que as entidades do Terceiro sector eram parceiros e deveriam ser tratados como tal, numa relação de igualdade com os organismos públicos (posição na qual me revejo pois afinal todos fazemos parte de uma só Nação com os mesmos direitos e deveres).

Foi um Governo que, como se sabe, teve uma margem de manobra muito estreita para governar pois tinha de cumprir o memorando de entendimento com a designada Troika. Apesar dos constrangimentos, o Governo de Passos Coelho protegeu este sector durante um período difícil para o País. Pelo contrário, desde 2015, que este Governo tem menosprezado o sector além de que lhe moveu uma forte perseguição a diversos níveis dos quais destaco a asfixia financeira – através da imposição de um brutal aumento de custos e a um não aumento de receita (no caso dos cuidados continuados não houve aumento dessa receita e no sector social em geral estanão foi suficiente para cobrir os custos impostos). Razão pela qual se impõe a pergunta – o que quer o Governo para este sector?

Temos um discurso público no sentido de que o Governo conta com estas instituições, pretende criar mais e melhores equipamentos sociais, tendo para tal lançado os programas PARES e PRR. Na prática estes programas apenas comparticipam com 25% a 30%, respectivamente, a fundo perdido do investimento total (sem IVA), ao contrário da propaganda de que comparticipam com 80% e 100% respectivamente; e o aumento da receita que o Governo dá às organizações do sector não é suficiente para cobrir os aumentos de custos que o mesmo Governo impõe, provocando-lhescada vez mais um maior défice na sua actividade.

Temos um discurso público no sentido de que o Governo conta com estas instituições, pretende criar mais e melhores equipamentos sociais, tendo para tal lançado os programas PARES e PRR. Na prática estes programas apenas comparticipam com 25% a 30%, respectivamente, a fundo perdido do investimento total (sem IVA), ao contrário da propaganda de que comparticipam com 80% e 100% respectivamente; e o aumento da receita que o Governo dá às organizações do sector não é suficiente para cobrir os aumentos de custos que o mesmo Governo impõe, provocando-lhescada vez mais um maior défice na sua actividade.

Devido a esta política de criação de défices às instituições, algumas entraram mesmo em insolvência outras tiveram de encerrar parte da sua actividade para não comprometer o todo. O resultado foi a diminuição na oferta de vagas em diversas áreas das quais se destacam os cuidados continuados que encerraram 207 camas entre 2021 e 2022.

Entretanto, há diversas entidades públicas, nomeadamente autarquias, a irem buscar verbas ao PRR (que foram anunciadas como sendo apenas para IPSS) para construir diversos equipamentos sociais (creches por exemplo) e de saúde (hospitais de proximidade disfarçados mas que na realidade são camas em cuidados continuados), além de que o próprio Orçamento de Estado financia estes “hospitais de proximidade” bem como camas em cuidados continuados que são da única Santa Casa da Misericórdia pública (a de Lisboa).

Ou seja, aquilo que me parece ao analisar estes fenómenos, é que o Estado por um lado asfixia financeiramente estas organizações levando-as a encerrar parcial ou totalmente, ao mesmo tempo que vai criando vagas públicas para as substituir.

Sabendo nós que a lei de bases da saúde foi alterada (passando os privados a serem supletivos, que é o mesmo que dizer – são como a pastilha elástica e quando não forem preciso mandam fora) e que há uma transferência de competências da acção social, educação e saúde para os municípios, parece que há aqui um verdadeiro plano de substituição do privado pelo público, feito de uma forma encapotada e não às claras.

Como já tenho dito várias vezes, uma nacionalização (forçada ou negociada) seria preferível do que matar aos poucos o sector com todas as consequências sociais e económicas que isso implica. É caso igualmente para perguntar se um trabalhador neste sector privado (com ou sem fins lucrativos) é uma besta mas se trabalhar para o sector público será promovido a bestial?

Por fim, lamentavelmente ainda hoje e após 26 anos de cooperação entre o Estado e o Terceiro sector, continua o discurso (transversal à generalidade da administração pública e aos políticos) de que este sector é não lucrativo, logo tem de procurar donativos na “sociedade civil” (não sei o que é isso, confesso a minha ignorância) bem como nas empresas. Ou seja, classe política e administração pública impõem um quadro legal e exigem profissionalismo no apoio prestado pelas IPSS mas depois sugerem que isso seja feito em boa parte com donativos.

Como se um Orçamento, salários, compras de bens e serviços, ou seja, custos fixos, pudessem ser feitos com base em supostos donativos (que podem ou não acontecer e que o mais provável é não acontecerem mesmo, alémde que são sempre verbas pequeníssimas quando tal sucede) e, em acréscimo, cumprir um cada vez maior aumento de normas legais que vão desde a qualidade do ar, à qualidade da água, renovação de ar 24h por dia, até normas de segurança alimentar e dos edifícios. Como é possível fazer tudo isto sem um correspondente envelope financeiro que suporte todos estes custos?

Termino como comecei, o que quer então o Governo para este sector?

Por José Bourdain, Presidente da ANCC

Debate sobre o Terceiro Sector (2)

Terminei o artigo anterior com a seguinte pergunta: faz ou não sentido este modelo (o Estado delega nas IPSS as funções de acção social alargada), ou é preferível um modelo em que é tudo Público?

Numa lógica política e seguindo as práticas e ideologia da esquerda e extrema-esquerda em Portugal, cujo melhor exemplo foi a designada “geringonça”, em que tudo deve ser Estado, ou seja, o Estado tudo controla, tudo tem que estar na esfera do Estado; a resposta é sim. Aliás, foi isso que se fez ao longo dos últimos 7 anos e continua a ser seguida essa política apesar de já não haver “geringonça”.

O melhor exemplo de todos são as parcerias público-privadas em que o insuspeito Tribunal de Contas elogia como sendo uma boa medida de melhor serviço para o cidadão com poupança de verbas significativas (várias centenas de milhões de euros) para o Estado/Contribuinte. No entanto, apenas por ideologia e teimosia, o Governo acabou com quase todas (sobrou uma) tendo o serviço piorado e os custos aumentado exponencialmente.

Qualquer pessoa que leia os meus artigos de opinião, sobre esta e outras matérias, pensará que sendo eu de direita, relativamente liberale, sobretudo, sendo eu dirigente de uma destas instituições, seria totalmente contra. Pois para surpresa de muitos, não sou.

É-me indiferente se é o Público ou o privado a assumir na prática este papel da Acção Social. Trabalho desde os 16 anos neste sector, há quase 35 anos, e sempre o fiz pela causa, tendo inclusive trabalhado diversos anos com salários em atraso.

Está bom de ver que não é pelo dinheiro. Penso que falo pela esmagadora maioria de pessoas que trabalha neste sector. Caso a organização que dirijo passasse para a esfera do Estado, as pessoas que nela trabalham passariam todas a ser funcionárias públicas, a usufruírem, quase o dobro do salário (nalguns casos mais do dobro) e a ter mais e melhores regalias. Eu sairia e no meu lugar ficaria um boy ou girl do partido do Governo.

Vamos às vantagens e desvantagens de ambos os modelos:

  1. Como referi, no público, os profissionais iriam beneficiar de melhores salários e mais regalias por oposição aos salários miseráveis actuais.
  2. No modelo público não existiriam salários em atraso, nem problemas de gestão no que respeita a prejuízos e/ou dívidas a fornecedores e à banca, como acontece actualmente, pois cá estariam os impostos dos contribuintes para cobrir eventuais problemas.
  3. Os custos do gás e luz subiram imenso? Há uma inflação brutal? No Público não faz mal, os impostos resolvem. Já no privado não é assim, onde por vezes se encerra a actividade.
  4. No privado os recursos humanos são escassos? Não faz mal, no público contrata-se o dobro e pelo meio ainda se reduz o horário de trabalho para todos.
  5. No sector público, apesar do aumento do número de trabalhadores, os serviços têm piorado e há mais atrasos. Será que estas IPSS funcionariam melhor com gestão pública? Eu duvido, pois não tem sido esse o exemplo, mas… quem sabe.
  6. No privado há uma gestão mais próxima, mais descentralizada e até alguma competição saudável. No público todos sabemos que “máquinas” grandes e complexas não funcionam bem, pelo que dificilmente o serviço seria melhor mas nunca se sabe.
  7. Talvez até no modelo público, com mais recursos humanos, sem grande controlo e limite nos gastos com materiais diversos, provavelmente os utentes teriam um melhor serviço. Ou não. Nada como experimentar.

Pensará o leitor. Bom, mas se este sector for público e os salários forem aproximadamenteo dobro do que se paga actualmente, só por aqui teremos um grave problema orçamental. Verdade, os custos iriam no mínimo duplicar. Mas não faz mal. É público (tal como as PPP que referi anteriormente) é só isso que importa.

De qualquer forma, seria preferível uma nacionalização (forçada ou negociada) feita de forma transparente, ao invés do que está a acontecer, políticas de asfixia financeira que levam estas organizações a encerrar valências ou mesmo a fechar portas definitivamente.

O melhor exemplo de todos é o dos Cuidados Continuados, cuja actualização de preços no espaço de 13 anos (2011-2022) foi feita uma única vez em 2019 (2,2%), quando os custos subiram exponencialmente, sobretudo com aumentos do salário mínimo, Taxa Social Única e outras obrigatoriedades legais impostas, das quais destaco o aumento dos rácios de recursos humanos. Acrescento que durante a pandemia, quando todo o sector da saúde recebeu reforço orçamental, os cuidados continuados não receberam um único cêntimo.

Ora isto é propositado para levar à tal asfixia e consequente encerramento, pois ao mesmo tempoo Governo vai abrindo camas públicas em cuidados continuados, não só através da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (a única que é pública) como através de parcerias com os municípios através dos hospitais de proximidade (exemplos o do Seixal e Sintra) que na realidade não são hospitais mas sim Unidades de Cuidados Continuados pois não têm camas de internamento hospitalar.

Outra evidência é que no PRR foram anunciados mais de 400 milhões para o Sector Social mas uma parte deste valor vai para os municípios construírem equipamentos sociais numa lógica de substituição das IPSS (exemplo: construção de várias Creches, entre outros).

Por fim, há algo ainda sobre o qual importa reflectir: O Governo e o Parlamento têm o poder de criar e alterar decretos-lei e leis, respectivamente. Ambos são responsáveis pelo subfinanciamento no sector social. Considerando a composição do Parlamento, será justo dizer que a maior responsabilidade é mesmo do Governo, no sentido de criminalizar os administradores de empresas que faltem com pagamentos à Segurança Social e Finanças, entre outras matérias.

Mas não se pune o comportamento do Governo quando este não cumpre com os pagamentos devidos a entidades terceiras, quando incumpre normativos por ele criados e comete ilegalidades. Contudo, se uma IPSS entra em dificuldades financeiras por causa das decisões do Governo e não cumpre com os pagamentos ao Estado nem aos seus colaboradores e fornecedores, os seus administradores podem ser presos e condenados ao pagamento depesadas multas.

Por fim, e perante aquilo que aqui escrevo bem como já escrevi/denunciei em artigos anteriores, nomeadamente o facto de o Governo não cumprir as leis e de discriminar cidadãos e instituições (nalguns casos diria mesmo perseguição e punição),gostava que o leitor se interrogasse se Portugal é uma verdadeira democracia e um Estado de Direito Democrático. E já agora, se não temem pelo futuro do País e até onde esta política nos levará a todos.

Debate sobre o Terceiro Sector (1)

Este será o primeiro de alguns artigos sobre o sector social/saúde/educação. O objectivo é fazer algo que nunca foi feito – lançar o debate para que se possa pensar neste sector e discutir publicamente o seu modelo de funcionamento, de “mente aberta”, sem corporativismos, questionando o que fará, ou não, sentido, o que será, no fundo melhor para o País.

Como já tenho referido por diversas vezes, este sector é fundamental ao funcionamento da sociedade portuguesa a muitos níveis, mais que não seja, porque todo e qualquer cidadão, ao longo da sua vida, cruzar-se-á de forma directa ou indirecta, com uma instituição do 3º sector (Cooperativas, Associações, IPSS, Misericórdias, etc).

Estas organizações sem fins lucrativos apoiam desde a nascença até à morte, milhões de pessoas nas mais diversas áreas: a) acção social – por exemplo crianças (creches), deficiência (actividades ocupacionais, formação profissional e residência), idosos (centros de dia e lares, apoio domiciliário); b) saúde – por exemplo cuidados continuados, apoio a pessoas com HIV, toxicodependentes, saúde mental, etc.; c) educação – por exemplo jardins de infância, apoio a crianças e jovens com deficiência nas escolas, etc.

Infelizmente, a comunicação social não dá atenção a este sector, a não ser por más razões (negligência e outras que ocorrem ocasionalmente). Sempre que se discute publicamente questões como o Orçamento de Estado, apoios para um sector em dificuldades ou a diminuição de poder de compra dos funcionários públicos; este sector e os profissionais que nele trabalham são sistematicamente esquecidos e desprezados, quando estas organizações, e quem nelas trabalha, prestam um verdadeiro serviço público e, como tal, deviam ser igualmente equiparados à função pública.

É pois um sector que não é respeitado e que, infelizmente, também não se dá ao respeito pois o Governo faz o que quer e bem entende e quem representa este sector acaba por ter uma postura de subserviência, não reclamando, não fazendo greves ou manifestações; ou seja, é como se não existisse, não contasse para nada, quando na realidade, reforço, é de enorme importância.

Então e como funciona este modelo? Há 26 anos o Governo de António Guterres decidiu criar o designado Pacto para a Solidariedade Social (19/12/1996) para enquadrar legalmente algo que já estava a ser feito na prática.

Este pacto consiste, de forma resumida, em delegar nas organizações sem fins lucrativos esta responsabilidade do Estado na acção social através de contractos/acordos de cooperação em que o Estado se compromete, entre outras coisas, a:

  1. Comparticipar o custo das respostas sociais, sendo que o valor a pagar será o custo médio de cada resposta social levando em linha de conta a condição socioeconómica dos utentes a beneficiar do serviço bem como a caracterização socioeconómica das zonas em que as organizações actuam.
  2. Comparticipar, através do PIDDAC (Orçamento de Estado) nas despesas com as obras de construção ou remodelação de instalações,bem como na aquisição de equipamentos necessários ao seu funcionamento.

As instituições devem:

  1. Estabelecer critérios de comparticipações familiares justos aos seus clientes levando em linha de conta os rendimentos do agregado familiar.

No entanto, nunca nada disto foi cumprido:

  1. O Subfinanciamento nestas respostas sociais tem vindo a piorar a cada ano, estando completamente desajustados daquilo que foi preconizado. O Estado paga o mesmo valor independentemente da condição socioeconómica das pessoas e do território onde se inserem, exigindo o mesmo serviço e o cumprimento da legislação sem qualquer diferenciação de nenhum tipo.
  2. As escassas verbas para investimento nunca vieram do Orçamento de Estado mas sim de verbas comunitárias ou provenientes do jogo (euromilhões, totoloto, totobola), apenas para financiar uma parte dos investimentos (muito pequena nos exemplos mais recentes, não chega a 30% do valor sem IVA) e praticamente inexistente para remodelações ou aquisição de equipamentos.
  3. Estes critérios de comparticipações familiares, nunca foram definidos pelas instituições, foram antes impostos pelo Estado, ficando as instituições sem qualquer margem de manobra na sua gestão, no que às receitas diz respeito, sem poderem definir preços.

Mais recentemente, este Pacto foi renovado (21/12/2021) aquando dos 25 anos do seu aniversário, tendo sofrido algumas alterações, sendo mantido o compromisso de apoio do anterior, ao qual acresce:

  1. Assegurar, de forma progressiva, o reforço financeiro às várias respostas sociais de forma a atingir uma repartição equitativa dos custos médios por utente.
  2. Forte reconversão das frotas.

Ou seja, neste Pacto o Governo assume que está a pagar abaixo do valor que devia e no seu discurso, o Primeiro-Ministro refere isso mesmo: que pretende chegar ao pagamento de pelo menos 50% dos custos (em 2021 eram 36%) e que pretende a valorização salarial dos profissionais deste sector.

Quanto à reconversão das frotas nunca nenhum passo foi dado nesse sentido, quanto à aproximação dos 50% dos custos e da valorização de salários dos trabalhadores, existiu uma excelente oportunidade para colocar em prática este discurso em 2022 mas, mais uma vez, nada foi feito. Para que possam constatar esta minha afirmação, fica aqui a tabela salarial da CNIS (que representa as IPSS) pela qual se regem a maioria das instituições em Portugal.

A média salarial da função pública, em 2021, foi de 1.536€. O Primeiro-Ministro quer que as empresas paguem a um jovem licenciado que entra no mercado de trabalho 1.360€. Tem nas suas mãos aumentar os salários dos profissionais do terceiro sector e não o faz propositadamente.

Conforme se pode verificarna tabela, um jovem licenciado começa no nível 10 ou 9 com salários de 735€ ou 785€, muito longe dos 1.360€ sugeridos pelo Primeiro-Ministro e quer este valor, quer os 1.536€ da média salarial da função pública estão bem acima do nível máximo desta tabela (director).

Para finalizar esta primeira parte, impõe-se a grande questão: faz ou não sentido este modelo, ou seria preferível um modelo em que seria tudo público?

Nos próximos artigos reflectiremos sobre esta questão e é muito importante fazê-lo.

Associação de cuidados continuados apresenta a Bruxelas queixa contra o Estado

A Associação Nacional dos Cuidados Continuados (ANCC) enviou hoje à Comissão Europeia uma queixa contra o Estado português, alegando que “não cumpre a legislação que produz” em relação a um setor em risco de sofrer uma “hecatombe”.

“O Governo, junto da União Europeia, tem um discurso que está a seguir os pilares europeus, mas, na prática, não cumpre a própria legislação que produz, nem a legislação europeia nestas matérias”, adiantou à Lusa o presidente da ANCC.

Segundo José Bourdain, entre outras matérias, em causa está a falta de atualização de preços de acordo com o que prevê a legislação das unidades de cuidados continuados, que tiveram, nos últimos anos, um “aumento brutal de custos”, devido aos acréscimos do salário mínimo nacional, da taxa social única e do rácio de recursos humanos.

“Algumas unidades já foram à falência, outras optaram por fechar e não tenho dúvidas que, agora com este aumento da inflação e dos custos da energia e do salário mínimo, haverá uma hecatombe neste setor”, alertou o presidente da ANCC.

Apontou o exemplo da unidade de cuidados continuados que gere, em Sintra, que viu a fatura da luz aumentar de 3.900 euros em agosto de 2021 para 12.800 em agosto deste ano, enquanto os custos mensais do gás subiram de pouco mais de 1.000 para cerca 5.500 euros.

“Não tenho dúvidas que, com este aumento brutal da inflação e dos custos com gás e luz, há muitas unidades que vão ter de escolher entre pagar a fatura da luz e do gás ou pagar os salários aos trabalhadores”, sublinhou.

José Bourdain lamentou ainda que o setor tenha sido “deixado de fora” dos programas criados para apoiar a indústria devido aos aumentos da energia.

Segundo dados disponibilizados pela ANCC, que tem nas unidades associadas um total de 1.586 camas, fecharam 115 de quatro instituições das regiões Norte, Lisboa e Vale do Tejo e Alentejo.

A queixa contra o Estado português salienta a “forma sistemática e continuada” de incumprimento das suas obrigações, quer as “derivadas da legislação nacional, quer as derivadas dos compromissos assumidos junto da União Europeia”.

Uma das situações apresentadas diz respeito, segundo alega a ANCC, à “igualdade de tratamento dos utilizadores dos serviços de interesse geral” e à Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que “impõe um elevado nível de proteção da saúde humana”.

Neste caso, a ANCC aponta a diferenciação no tratamento de doentes com úlceras de pressão, em função do local onde estas se desenvolveram.

“O Estado português comparticipa o custo do tratamento apenas quando tais úlceras se desenvolvem em hospitais públicos, e não comparticipa quando se desenvolvem em qualquer outro lugar, casa, lar, serviços integrados de saúde”, refere a queixa apresentada pela associação.

Um estudo encomendado pela ANCC à Faculdade de Economia da Universidade do Porto, e que foi recentemente divulgado, indica que o valor pago pelo Estado a instituições da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) é “significativamente inferior” aos custos, um subfinanciamento que pode colocar em causa a qualidade dos serviços.

“Uma vez que o valor pago pelo Estado é significativamente inferior aos custos unitários suportados pelas instituições prestadoras dos cuidados continuados, tal poderá pôr em causa a qualidade desses serviços por parte de algumas instituições ou, inclusive, a própria sobrevivência”, adiantou o documento.

https://www.rtp.pt/noticias/pais/associacao-de-cuidados-continuados-apresenta-a-bruxelas-queixa-contra-o-estado_n1441329

O Sector Social só está minimamente bem com graves crises!

OPINIAO 21 de outubro 2022 às 16:50

O Sector Social só está minimamente bem com graves crises!

Em períodos de crescimento económico (ao contrário dos períodos de crise) em que, segundo o Sr. Primeiro-Ministro a “austeridade acabou em 2015”, seria suposto as IPSS viverem melhor, mas não é de todo o que acontece, pois com este Governo, desde 2015, que há uma enorme austeridade imposta ao sector social (área social/saúde/educação), uma verdadeira Troika Socialista/Comunista que se abateu sobre este sector. Passo a explicar. 

Por vezes falo sobre este tema nos mais diversos contextos e muitas pessoas ficam chocadas com esta afirmação (a qual faço propositadamente para captar melhor a atenção e só mais tarde acrescento a palavra “infelizmente” explicando porque razão isto acontece).

Quando existem crises graves na economia, nomeadamente recessões, como aquela mais recente de que todos têm memória e que sofreram imenso com ela (o período em que o PS e o Primeiro-Ministro José Sócrates levaram o País à falência tendo de pedir assistência internacional àquela que ficou conhecida por Troika) a actividade económica abranda imenso, há empresas a fechar portas, há perda de emprego e a maioria das empresas, se não a totalidade, baixa os preços dos bens e serviços numa tentativa, por vezes desesperada, de manter os seus negócios. O que acontece é uma diminuição muito significativa da sua receita.

E o que acontece no sector social? A receita é praticamente igual (no que respeita aos valores a receber pelo Estado é 100% igual), apenas diminuindo a parte da receita proveniente das famílias uma vez que estas pagam consoante os seus rendimentos. Os custos para as IPSS diminuem por força da crise, há mais disponibilidade de mão-de-obra no mercado de trabalho, por força das dificuldades de muitas pessoas o Estado recorre ao sector social para apoiar mais, mas o salário mínimo bem como os restantes salários ficam estagnados ou mesmo diminuem por força da perda de regalias.

Em períodos de crescimento económico (ao contrário dos períodos de crise) em que, segundo o Sr. Primeiro-Ministro a “austeridade acabou em 2015”, seria suposto as IPSS viverem melhor, mas não é de todo o que acontece, pois com este Governo, desde 2015, que há uma enorme austeridade imposta ao sector social (área social/saúde/educação), uma verdadeira Troika Socialista/Comunista que se abateu sobre este sector. Passo a explicar:

1. Desde 2015 que o salário mínimo tem subido de forma muito significativa impondo assim um aumento de custos brutal às IPSS;

2. O Governo tem legislado no sentido de obrigar estes sectores a contratar mais recursos humanos por força de mais exigências legais sendo o caso mais grave o dos cuidados continuados;

3. Houve um aumento continuado, nos últimos anos, da Taxa Social Única em 2,7% sobre todo o universo salarial das IPSS;

Estes foram os aumentos de custos mais significativos pois existiram muitos outros. E do lado da receita, que aumentos existiram?!

Como denunciei noutro artigo https://regiao-sul.pt/opiniao/sector-social-indignacao/600026 o Estado não cumpre sequer com a legislação que produz nem os aumentos que assina com os representantes do sector social. Ou seja, o que quero reforçar é que nos 7 anos de Governo PS, apenas em 2 anos os aumentos do sector social foram suficientes para cobrir o salário mínimo e, naturalmente, tornando impossível aumentar os salários aos outros trabalhadores. No caso particular dos cuidados continuados, em 13 anos (2011 a 2022), apenas houve um amento de 2,2% em 2019, ou seja, como bem se compreende torna impossível aumentar salários e nem sequer se dignaram a dar verbas que permitisse suportar o aumento do salário mínimo.

Como demonstrei, a austeridade só acabou para os clientes/eleitores da esquerda, como por exemplo os funcionários públicos oficiais (nós somos os não oficiais), pois para nós foi precisamente o inverso.

A pergunta é: mas qual a lógica disto? Não deveria o sector social acompanhar a evolução da economia? Para dar mais e melhores condições aos seus utentes? E também aos seus trabalhadores através de um aumento de salários semelhantes aos da função pública (pois até ganham metade do que os seus congéneres)?

Mas não! O Governo entende que este sector tem de continuar a pagar salários miseráveis, a ter dificuldades na contratação e atracção de pessoas, a ter de desgastar física e psicologicamente quem lá trabalha até à exaustão pois uma pessoa tem de fazer o trabalho de duas, não permitindo capacidade financeira para contratar o pessoal indispensável ao bom funcionamento de qualquer organização.

O Governo entende que não só este sector deve depender em grande parte de donativos para funcionar (como se custos fixos e um orçamento pudesse ser feito com base em supostos donativos que podem ou não acontecer, sendo que o mais provável é não acontecer mesmo), como também acha que estas organizações só funcionam com enfermeiros, auxiliares de acção médica, ajudantes de apoio a pessoas com deficiência e idosos, terapeutas e psicólogos. O Governo acha que uma qualquer organização não precisa de juristas, contabilistas, administrativos, cozinheiros, ajudantes de cozinha, motoristas, pessoal de limpeza e lavandaria, etc. Se alguém tem dúvidas do que aqui afirmo basta consultar a legislação sobre este sector.

Insisto naquilo que já tenho comentado em intervenções públicas anteriores: o modelo de funcionamento deste sector tem de ser revisto:

a) As verbas para o sector social e dos cuidados continuados não constam do Orçamento de Estado;

b) É impossível às IPSS fazerem um orçamento com rigor pois nunca sabem se no ano seguinte o Estado vai ou não aumentar os valores que paga a estas organizações e, no caso de aumentar, não sabem quanto;

c) Em Janeiro do ano seguinte estão a suportar aumentos de custos elevados sem a sua componente respectiva de receita;

d) As verbas dos Cuidados Continuados provêm da receita do jogo gerado pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e as do sector social são “os restos” que sobram de rúbricas do Orçamento da Segurança Social (para ser sincero nem sei bem pois não existe qualquer menção em lado nenhum em nenhuma rúbrica do Orçamento da Segurança Social);

e) As receitas das IPSS são variáveis pois a parte paga pelos clientes/famílias dos utentes são variáveis e dependem dos seus rendimentos. Há IPSS a funcionar em bairros onde vivem pessoas da classe média alta ou alta e que, regra geral, têm menos problemas financeiros logo têm uma receita superior àquelas que existem em bairros de famílias com rendimentos mais baixos, sendo que estas IPSS têm enormes dificuldades em cumprir com a sua missão, pois a sua receita é mais baixa. Qual a lógica disto, se a legislação a cumprir tem de ser igual e o serviço deve ter os mesmos padrões de qualidade?

f) E que dizer das IPSS que ficam em territórios de baixa densidade, que pagam mais caros os bens e os serviços e têm também custos mais elevados para atrair e remunerar os seus recursos humanos? Por que razão não recebem uma majoração do valor a pagar pelo Estado?

g) A legislação laboral em Portugal é inimiga do emprego e sobretudo dos bons trabalhadores pois defende, erradamente, os maus trabalhadores (os preguiçosos, que vivem de esquemas, os “profissionais” do fundo de desemprego, das baixas médicas e das tentativas de sacar indemnizações às seguradoras). Se esta legislação é errada em geral, é ainda mais no sector das IPSS em que são pessoas a trabalhar literalmente para cuidar de pessoas. E aqui deveria haver uma diferenciação, pelo menos, face à legislação em geral. O Governo e a esquerda em geral, tudo têm feito para forçar as empresas a contratar sem termo (os designados trabalhadores efectivos).Ninguém na sociedade fala sobre o chamado “elefante na sala”, ou seja, qual a principal razão porque uma empresa faz um contrato a termo certo? A resposta é: para além dos motivos óbvios (projecto temporário, substituição temporária de um colaborador ausente por férias, por baixa, etc.) é para avaliar o trabalhador (as suas qualidades pessoais e profissionais) e se este se ajusta aquele posto de trabalho. Porque infelizmente o código do trabalho protege tanto o “trabalhador que não quer trabalhar” ao ponto do período experimental ser insuficiente e os mecanismos para o despedimento por inadaptação ou por justa causa de despedimento serem muito difíceis de executar. Nas IPSS, e julgo que na esmagadora maioria das empresas, ninguém despede só porque sim, apenas precisa de ter a possibilidade de despedir quem não se enquadra e é com prazer que a maioria das pessoas fica efectiva (sem termo). Mais uma vez uma política errada que só prejudica o País e em particular este sector.

Por fim, a perseguição deste Governo e da esquerda a tudo quanto é sector privado, seja com ou sem fins lucrativos. Apenas para relembrar a perseguição aos colégios privados de todo o tipo de ensino, incluindo creches, ensino especial (crianças e jovens com deficiência) privado, centros de recurso para a Inclusão (apoio de IPSS a crianças e jovens com deficiência nas escolas), formação profissional a pessoas com deficiência, cuidados continuados, apoio a toxicodependentes, sem abrigo, etc. em que na maioria dos casos não actualiza comparticipações desde há muitos anos e as que actualiza, fá-lo com valores que são inferiores aos custos que o mesmo Governo inflige a estas organizações. E fá-lo porque há a tal agenda escondida (que tenho denunciado) que é acabar com estas organizações, levando-as a encerrar ao mesmo tempo que o sector público vai criando estruturas paralelas. É caso para dizer: que desperdício de recursos financeiros, materiais e humanos quando seria mais fácil a honestidade de nacionalizar este sector, mesmo que negociando essa nacionalização. Tudo, apenas e só, por preconceito ideológico.

Muito mais teria a dizer mas estes espaços de intervenção cívica não são infinitos. Termino com um pedido aos órgãos de comunicação social: que façam trabalhos mais profundos sobre este sector e que os divulguem pois infelizmente vivemos num País em que o que não aparece nas televisões (principalmente neste meio de comunicação) nem nos jornais e rádios, é como se não existisse. Com isso estariam a prestar um enorme serviço ao País mas também a si próprios pois, mais cedo ou mais tarde, nós ou familiares e amigos em diferentes momentos das nossas vidas, vamos sempre precisar de uma IPSS.

https://sol.sapo.pt/artigo/783740/o-sector-social-so-esta-minimamente-bem-com-graves-crises-

Sector Social: indignação

Este Governo tem uma agenda escondida de encerrar as instituições do sector social aos poucos, à medida que, também aos poucos, vai criando oferta pública para substituir a que vai encerrando.

Por vezes amigos e pessoas conhecidas dizem-me que devia ser mais contido, falar menos, escrever menos e, sobretudo, contestar menos, nomeadamente em relação a quem nos governa, pois além de criar uns quantos inimigos arrisco-me a sofrer represálias pessoais e profissionais. A minha resposta é: num país supostamente democrático, num Estado de Direito Democrático ninguém deve ter medo de dizer o que pensa nem de emitir a sua opinião, naturalmente com respeito e educação. É essa, a beleza (entre outras) da Democracia.

Democraticamente não consigo ficar calado, estou indignado com o que vi e ouvi no passado dia 13 de Outubro na SICNOTICIAS, ao ver uma entrevista ao Padre Lino Maia, Presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), a propósito das declarações do Presidente da República sobre os casos de pedofilia na Igreja (assunto que não vou abordar aqui) e que termina com o jornalista a colocar várias questões relevantes ao Presidente da CNIS sobre o sector social.

A comunicação social, infelizmente, não quer saber deste sector, não lhe dá a devida atenção e nunca é notícia a não ser por más razões de casos isolados, de negligência, etc. Veja-se, por exemplo, quando se fala em Orçamento de Estado, crises neste e naquele sector, programas de apoio para este sector e aquele, o sector social é como se não existisse. O mesmo se passa na saúde no caso dos cuidados continuados (verdadeiros hospitais de 2ª linha) aos quais ninguém dá a devida importância.

No entanto, desta vez, o jornalista Miguel Prates colocou questões muitíssimo pertinentes, de forma clara e directa, sobre os verdadeiros e graves problemas que este sector atravessa. Obrigado Miguel Prates, pois nunca tinha visto nenhum jornalista em nenhum órgão de comunicação social fazer perguntas tão objectivas, o que revela conhecimento e preparação. Um verdadeiro serviço público daquilo que deveria ser o verdadeiro jornalismo.

Quanto eu gostava de estar no lugar do Presidente da CNIS para responder àquelas perguntas. Como não estava, vou tentar responder através deste artigo.

O jornalista pergunta por que razão o Presidente da CNIS assinou os acordos de compromisso para o sector social bem como o pacto social (que fez 25 anos em 2021), os quais não estão a ser cumpridos pelo Estado, e questiona se considera ser a melhor pessoa para continuar à frente da CNIS. Este não responde à pergunta, somente diz que está disponível para continuar a servir.

Mas respondo eu:

  1. O Presidente da CNIS, em 2017 e 2018, assinou com o Governo os aumentos dos cuidados continuados e o governo não cumpriu. O que fez? O que disse? Nada.
  2. O Presidente da CNIS, no ano passado, assinou o aumento de 6% em cuidados continuados de longa duração e depois, na prática, o governo aumentou 4,9%? Que disse, que fez? Nada.
  3. O Presidente da CNIS, sobre o Pacto social assinado no ano passado, em que o Primeiro-Ministro se comprometeu a chegar aos 50% do pagamento dos custos das várias respostas sociais e que este ano não cumpriu (ao contrário do que diz o Presidente da CNIS que se deram passos nesse sentido. Não, não deram, é falso). Que fez ou disse? Nada.
  4. Tivemos dois anos de pandemia, em que todo o sector da saúde recebeu reforço orçamental para fazer face ao brutal aumento de custos. Para os cuidados continuados nem 1 cêntimo. Uma enorme discriminação, diria mesmo perseguição. Que fez ou disse o presidente da CNIS? Nada.
  5. No Compromisso de 2022, assinado em Julho, não contemplou aumentos para os cuidados continuados, ao contrário dos aumentos insuficientes para o sector social. Ficou assinado que até dia 15 de Setembro o Governo se comprometia a aumentar os preços (que em 13 anos aumentou uma única vez). Mais uma vez o Governo não cumpriu e escrevo este artigo no dia 14 de Outubro. Que fez ou disse sobre o assunto? Nada. Acrescento que o Presidente da União das Misericórdias, precisamente a 15 de Setembro e quando todos os representantes de sindicatos e entidades patronais criticaram as medidas do Governo paras as famílias e empresas, este, espantosamente, no noticiário da meia-noite na TSF, elogiava as medidas do Governo. Nem sequer uma palavra para dizer que naquele mesmo dia terminara o prazo de um compromisso que ele também assinou e que o Governo não cumpriu, e teve uma excelente oportunidade para o fazer. Espanta-me que estes dois senhores que representam a esmagadora maioria do sector social e dos cuidados continuados em Portugal se comportem como membros do partido que suporta o Governo ou mesmo como sendo membros do Governo, em vez de representarem os seus associados. Ao serem coniventes com o Governo prejudicam aqueles que deveriam representar e por arrasto todo um sector social e da saúde. Lamentável a todos os títulos.
  6. Não há pessoas para trabalhar neste sector, daí que, por vezes, haja casos de negligência, infelizmente, tal é a falta de recursos humanos. E muitos dos que existem estão mal preparados ou simplesmente não estão talhados para estas tarefas. A diminuição da subsidiodependência podia ajudar, bem como a imigração, e o Governo anda há meses a prometer facilidades para os imigrantes mas até agora nada se pode concretizar para importar mão-de-obra. Que disse sobre este assunto? Nada.
  7. A tabela salarial da CNIS (pela qual se regem a maioria das IPSS) é miserável. Um director que está no escalão máximo ganha 1.244,00 euros e nem sequer chega à média salarial da Função pública (1.536,00 euros) e está longe dos 1.320,00 euros que o Primeiro-Ministro quer que as empresas paguem a jovens em início de carreira. Que tem a dizer sobre isto? Nada.
  8. O Governo, no dia 15 de Setembro, anunciou medidas para as IPSS. Mais dívida através de uma linha de crédito de 125 milhões e também 125 milhões para apoios aos custos no Gás. Por acaso sabem que afinal o apoio é de 5 milhões? (os 125 são propaganda), ou seja ridículo, e que as IPSS foram deixadas de lado no programa que o Governo criou para apoiar os custos com energia das empresas? Os custos com energia subiram exponencialmente para muitas IPSS (passou-se de 0,015€ o kwh no gás (sim, 1 cêntimo e meio, não é erro) para 0,20€ e na luz de 0,05€ para 0,32€). Acresce a inflação brutal que aumenta todos os outros custos. Que diz o Presidente da CNIS sobre isto? Nada.
  9. O jornalista, mais uma vez e muito bem, questiona como é que as IPSS têm dívidas que não conseguem pagar e se mantêm a funcionar, bem como o facto de haver Instituições a fechar portas, pois o financiamento não é actualizado. Tal e qual a realidade. Mais uma vez, o Presidente da CNIS foge às questões directas do jornalista. Mas infelizmente é a realidade. IPSS que fecham valências, outras que encerram totalmente a sua actividade,diminuindo assim o apoio a crianças, jovens e adultos com deficiência e idosos. No caso dos cuidados continuados, por exemplo, este ano já encerraram duas unidades por insolvência, outra anunciou que iria encerrar no final do ano e em 2021 já tinham fechado mais. Não tenho dúvidas de que este ano e no próximo haverá uma hecatombe neste sector por força do subfinanciamento provocado pelo Governo.
  10. O Governo anuncia 100% a fundo perdido do PRR para construir equipamentos sociais e de saúde mas na realidade representa cerca de 25 a 30% do investimento, pois com o custo elevado do m2 (entre 1.500,00 euros a 1.600,00 euros) fica muito longe dos pouco mais de 600,00 euros o m2 que o Governo estimou. O mesmo se passa no Programa PARES. Que diz o Presidente da CNIS sobre esta matéria? Nada.
  11. À pergunta do jornalista sobre a actualização de valores para as IPSS face à inflação, mais uma vez o Presidente da CNIS nada responde, limitando-se a comentar a fiscalidade quando isso não é sequer o maior problema e desculpando o Governo com a guerra na Ucrânia. Esqueceu-se de dizer que a guerra na Ucrânia não impede o Governo de aumentar os funcionários públicos mas impede de aumentar os salários do sector social, que este senhor deveria ser o primeiro a defender. Este Governo tem sido, desde 2015, uma verdadeira Troika e uma verdadeira austeridade para o sector social/saúde/educação apenas e só por preconceito ideológico e tem uma agenda escondida de encerrar estas instituições aos poucos, à medida que, também aos poucos, vai criando oferta pública para substituir a que vai encerrando. Mais valia serem honestos e assumir aquilo que pretendem – nacionalizar estes sectores e passar tudo para a esfera do Estado.

Em 7 anos de Governo, apenas em 2 anos os valores de aumentos nas comparticipações do Estado foram suficientes para cobrir os aumentos do salário mínimo nacional. Aos outros trabalhadores que ganham acima disso não é possível ter aumentos e há IPSS que não aumentam os salários aos seus trabalhadores há mais de 10 anos. Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Presidente da CNIS, nós, nas IPSS, e em particular nos cuidados continuados, queremos em Janeiro de 2023 aumentar em pelo menos 50,00 euros todos os trabalhadores, tal e qual como na função pública, pois prestamos igualmente um serviço público mas auferimos metade do valor. Agradecemos que nos dêem as condições financeiras para isso. O Governo anunciou já para 2023, 50,00 euros de aumento do SMN, que chegará aos 900,00 euros em 2026. Ou seja, em 2026 licenciados e indiferenciados passarão a ganhar todos o mesmo, tal e qual como em Cuba e noutros países comunistas/socialistas.

As exigências legais são cada vez maiores – o que implica mais custos. No entanto, as verbas a pagar pelo Estado não acompanham essas exigências que o mesmo faz, para que as IPSS possam cumprir bem a sua missão.

Há IPSS desesperadas sem dinheiro para cumprir a sua elementar missão e têm de escolher entre pagar salários ou as facturas da luz e do gás.

Por fim, termino como comecei, com educação e respeito mas frontal e directo a dizer o que penso. Nada me move contra estas pessoas do ponto de vista pessoal e nem sequer as conheço. O Sr. Presidente da CNIS diz que está cá para servir (referindo-se à sua recandidatura ao lugar). Pois eu sugiro-lhe a si, e já agora também ao Presidente da União das Misericórdias, que sirvam o vosso País mas também as organizações que representam, e se afastem, vão gozar a reforma e deixem os lugares para alguém que verdadeiramente defenda as organizações, os utentes que beneficiam dos seus serviços e os trabalhadores.

A ANCC já pediu para reunir com ambos numa lógica construtiva para debater os problemas do sector dos cuidados continuados e nem sequer se dignam a responder. Pela nossa parte fica novamente aqui o convite para que o façam. Para bem do sector, mas sobretudo para bem do País.

O serviço público escondido

Por acaso o leitor conhece algum sector da actividade económica em que praticamente 40% das empresas dão prejuízo? Pois é o caso das IPSS.

Inicio este artigo com uma pergunta: alguém sabe como funciona o designado sector Social? Permitam-me que tente, de forma sucinta, elucidar.

Como todos certamente sabem, nas sociedades de uma forma geral (e dito de forma muito simplista), os Cidadãos pagam impostos, contribuindo assim para o bem comum, o Governo que elegemos gere esse dinheiro por forma a proporcionar serviços que beneficiam esses mesmos cidadãos: saúde, segurança, educação, etc. A Administração Pública – funcionários e estruturas físicas (hospitais, escolas, etc.) – dependem a 100% desses mesmos impostos (para os quais igualmente contribuem) e das decisões do Governo. Ou seja, o Governo decide os salários dos funcionários públicos bem como a gestão de hospitais, escolas, etc.; que obras se fazem, que equipamentos se renovam e por aí fora.

E no sector social, como funciona? Exactamente da mesma maneira – algo que a sociedade desconhece, sendo que existe autonomia na gestão (embora 95% condicionada pelo Governo). O que quero dizer com isto é que o Governo decide os valores que paga ao sector social pela prestação deste serviço público, invisível, e decide igualmente o que os utentes/clientes/familiares pagam a este sector. Ou seja, estas IPSS não têm qualquer forma de controlar a sua receita, os preços são todos impostos pelo Governo tal e qual numa sociedade Comunista/Socialista. A única diferença aqui, neste modelo, é que há instituições designadas privadas sem fins lucrativos, que ficam no meio entre as decisões do Governo e a prestação do serviço público (idosos, deficiência, infância, etc) pois de resto são uma Administração Pública “escondida”.

Se num hospital público os custos com salários ou com gás e luz sobem e esse hospital dá prejuízo, cá está o Orçamento de Estado para responder, ou seja, os impostos de todos nós. Se numa IPSS o dinheiro é curto, esta tem prejuízo, fica com um problema grave para resolver e que muitas vezes resulta no encerramento de estruturas – menos apoio social e desemprego.

Aquilo para que quero alertar com esta explicação é para o facto de este ser um sector esquecido pelo Governo mas também pelos órgãos de comunicação social, os quais não dão a devida atenção aos graves problemas que se vêm avolumando neste sector e que actualmente vive um momento crítico (o que contribui para o agravar dos problemas, lamentavelmente). Exemplos? Vamos a isso:

  1. Os custos com a luz subiram 3 vezes e com o gás natural 5 vezes, tal e qual como na indústria. A inflação está nos 9%. O que fez o Governo até agora para resolver o problema? Criou um programa de apoio à indústria e esqueceu-se das IPSS. Ou será que foi de propósito?
  2. No caso dos Cuidados Continuados entre 2011 e 2022 (12 anos), apenas houve um aumento de preços em 2019 de 2,2%, com todos os aumentos de custos verificados, dos quais destaco os aumentos do salário mínimo nacional. Em 2 anos de Pandemia, o Governo não deu 1 cêntimo a este sector, quando reforçou financeiramente todo o sector da saúde. Uma enorme discriminação e perseguição ideológica apenas por ser sector privado.
  3. O Primeiro-Ministro fala na dignificação dos salários mas não aplica isso na Administração Pública nem neste sector (limita-se a sugerir aos privados 20% de aumento em 4 anos mas não dá o exemplo). Na tabela salarial destas organizações (2021, ainda não actualizada), a maioria das categorias profissionais aufere o salário mínimo (onde um cozinheiro já ganha o mesmo que o ajudante de cozinha, por exemplo), um terapeuta ganha 800,00 euros, um psicólogo 900,00 euros e um director 1200,00 euros. Por comparação, a média salarialda função pública é de 1536,00 euros (dados de 2021).
  4. Quem sabe, por exemplo, que nos programas PARES e PRR, em que o Governo anunciou com pompa e circunstância que vai investir milhões e comparticipar a fundo perdido com 80% do custo do investimento (que no seu delírio o Governo estimou em pouco mais de 600,00 euros o m2), na prática vai dar 25% a fundo perdido (pois o custo m2 ronda os 1600,00 euros) e exige contractos de fidelização de 20 anos em troca desse mísero valor? E já agora, importa referir, estamos a falar de valores sem IVA.
  5. Por acaso o leitor conhece algum sector da actividade económica em que praticamente 40% das empresas dão prejuízo? Pois é o caso das IPSS, dados de um estudo da Universidade Católica do Porto publicado em dezembro de 2018. Desde então para cá o cenário piorou, infelizmente.

Muitos mais exemplos poderia dar mas gostava que este artigo servisse para que, quer a opinião pública, quer os jornalistas, dessem mais atenção a um sector que é fundamental para o bom funcionamento do País, sobretudo para as pessoas mais vulneráveis (económica e socialmente), sector que representa 6% do emprego nacional (e já agora, onde existe uma enorme falta de mão-de-obra, precisamente devido aos baixos salários e a um trabalho que é muito difícil, o que se traduz, por vezes, na diminuição da qualidade do serviço prestado).

Este Governo, infelizmente, não antecipa os problemas (apesar de alertado por diversas personalidades, nas quais me incluo) e nem mesmo com a casa a arder tenta sequer apagar o fogo, isto é, resolver os problemas graves já existentes. O importante é mesmo a propaganda e comunicações mentirosas, enquanto os problemas se agravam.

Receio que nos próximos meses, com recessão + inflação + subida das taxas de juro, as IPSS tenham de optar entre pagar os salários ou a conta da luz e gás, pois o dinheiro não chega para tudo, e, com isso, haja uma hecatombe neste sector com todas as consequências para a sociedade portuguesa.

Acresce a isto que quem assinou contractos para criar mais vagas em Creche, na deficiência ou idosos, nos programas PARES e PRR que referi, já está a desistir desses investimentos, pois não tem capacidade financeira para a sua realização. Além da falta que estes investimentos fazem ao País, são milhões de verbas do PRR que se vão perder.

Por fim, com o aumento da inflação em geral e dos custos com luz e gás em particular, estas IPSS estão a pagar ao Estado, sobretudo em IVA mas também noutros impostos, mais do que o Estado lhes está a devolver (apenas nalguns casos pois noutros devolve zero). Parece incrível, mas em vez de apoiar estas instituições num momento gravíssimo, o Governo não só não aumenta os preços a pagar pelos serviços (como é exemplo os cuidados continuados) como ainda lhes retira, através dos impostos, o pouco que têm para fazer face a todos os aumentos de custos por força da imposição do salário mínimo e outros custos (que todos conhecem e sentem no dia-a-dia), como sejam os bens e serviços em geral.

Tudo apenas e só por perseguição ideológica e incompetência deste (des)Governo.

Primeiro Ministro Brincalhão

Senhor Primeiro Ministro,

Gostaria de começar por louvar a sua intenção e dizer-lhe que pode contar com o meu total compromisso e disponibilidade para, nos próximos quatro anos, aumentar em 20% os salários dos trabalhadores da Cooperativa que dirijo. Tomo a liberdade de usar exactamente as suas palavras ditas em Julho de 2021,aquando da assinatura do Pacto de Cooperação com o 3º sector para os próximos dez anos, onde referiu que “devemos valorizar as carreiras dos profissionais que trabalham neste sector (6 % do total do emprego do País) ”e assumo desde já o meu compromisso em aumentar não 20% mas 40%. Assumo igualmente este compromisso por parte de todos os associados da Associação Nacional dos Cuidados Continuados (ANCC) da qual sou Presidente da Direcção. Precisamos apenas de uma pequena ajuda sua.

Tendo em conta que neste sector nós prestamos um serviço em nome do Estado e é V.Exª. que dita toda a nossa receita (os valores pagos pelo Estado e os valores que podemos cobrar às famílias), pedia-lhe então a sua ajuda para:

Aumentar os valores que nos paga pelos serviços que prestamos na exacta proporção dos aumentos salariais que o Senhor nos pede para dar (acrescidos da tal valorização que o Sr. prometeu);
Nesse aumento de valores leve em linha de conta a subida da inflação deste ano e ainda o aumento exponencial dos custos com energia que estamos a sofrer (equiparados aos da indústria pois o mercado é o mesmo). O Senhor Primeiro-Ministro criou um programa de apoio para os custos energéticos de vários sectores mas, como é hábito, esqueceu-se de nós.
Entretanto, a par deste aumento de custos, o Salário Mínimo Nacional (SMN) subiu, mais uma vez, em Janeiro deste ano. Desde 2015 que o SMN começou a subir de forma significativa mas os aumentos que o Senhor nos deu não foram suficientes para compensar essa mesma subida.
Para compensar tudo isto, as Organizações do sector social e solidário estão a receber exactamente o mesmo que em 2021 pois ainda não tiveram qualquer actualização de preços.
No caso específico dos Cuidados Continuados, entre 2011 e 2022 houve apenas uma actualização de 2,2% em 2019. Ou seja, dez anos sem actualizações de preços por parte do Estado, é obra! Certamente que, o facto de quatro Unidades de Cuidados Continuados terem fechado num curto espaço de tempo, será apenas uma enorme coincidência.
E que dizer de 2 anos de Pandemia em que todo o sector da Saúde viu os seus orçamentos reforçados para fazer face aos elevados aumentos de custos e os Cuidados Continuados não terem recebido um único cêntimo? O Sr. Primeiro Ministro é mesmo brincalhão J. Veja lá que nem um cêntimo nos deu, nem sequer uma máscara e ainda nos obrigou a gastar dinheiro para dar máscaras e outro material de protecção aos funcionários públicos que nos fiscalizam, uma a duas vezes por mês, pois nem material de protecção trazem.

Acresce que, Vª. Exa. assinou actualizações de preços em 2017 e 2018, em conjunto com os representantes do Sector Social (Compromisso para o Setor Social e Solidário e respectiva Adenda) mas simplesmente não as cumpriu. Aliás como não cumpriu a promessa de resolver o problema das dívidas das famílias entre outros compromissos assinados pelos seus Governos. Como também não cumpre a própria legislação do País, como por exemplo, a Portaria nº 1087-A/2007 de 5 de Setembro, de rever os preços dos Cuidados Continuados a cada 5 anos e aumentar os preços anualmente com base no Índice do preço ao Consumidor (IPC).

O resultado desta política é mais de 40% deste sector de actividade ter prejuízo. Confesso que não conheço nenhum sector de actividade com estes números. E não estou a falar de pandemias nem de guerras. Já é assim desde há vários anos e recordo o estudo da Universidade Católica do Porto publicado em dezembro de 2018.

Acresce que nestas Organizações, e a título de exemplo, o Ajudante de cozinha já ganha o mesmo que o Cozinheiro. As Organizações estão sempre em perda pois o aumento de receita (repito, da sua inteira responsabilidade) não é suficiente para cobrir o aumento dos custos, pelo que há profissionais que não têm um aumento de salário há mais de dez anos. Daí que seja cada vez mais difícil contratar profissionais para este sector e motivar os que ainda por cá andam. Como vê Senhor Primeiro Ministro, é fácil, basta apenas cumprir o que diz, o que assina e, já agora, também as leis do País.

Quem também é uma brincalhona e o acompanhou (e ainda acompanha) é Catarina Martins. Exige que as IPSS paguem melhores salários e ao mesmo tempo vota contra as propostas dos outros partidos em sede de discussão do Orçamento de Estado (tal como voltou a fazê-lo há poucos dias) para que este aumente as suas comparticipações a estas instituições.

Aqui há uns anos, numa greve que afectou as escolas o Sr. Primeiro Ministro tomou conta dos filhos do João Miguel Tavares para que este pudesse ir trabalhar. Não quer fazer algo parecido e vir mudar umas fraldas e limpar uns WC? É que duas “mãos” davam mesmo jeito pois não há pessoas para trabalhar.

https://sol.sapo.pt/artigo/773224/primeiro-ministro-brincalhao

por José Bourdain
(Presidente da ANCC e dirigente cooperativo 3º sector)

PAINEL DE DEBATE | SUSTENTABILIDADE E ECONOMIA SOCIAL

José Bourdain, Presidente do Conselho de Administração na CERCITOP

Inês Oom de Sousa, Presidente da Fundação Santander Portugal e Responsável de ESG do Grupo Santander Europa.

Maria João Andrade, Arquiteta

Moderação: Hugo Neutel, Moderador, Jornal de Negócios

Jornalistas, Comentadores e Populistas

Jornalistas, Comentadores e Populistas, in diário on line, Região Sul

https://sol.sapo.pt/artigo/758888/jornalistas-comentadores-e-populistas

Desde que comecei a interessar-me por política, mais ou menos há 20 anos, que tenho verificado que a comunicação social em geral favorece os partidos de esquerda, em especial o PS e o BE. Após uma tese de Mestrado sobre voto estratégico (cujo trabalho foi pioneiro a nível mundial) e um estudo sobre “eleitores fantasma”(que teve enorme impacto na comunicação social portuguesa e estrangeira), fui convidado por diversos órgãos de comunicação social, sobretudo televisões, para falar sobre o meu trabalho. Rapidamente comecei a ser convidado para o comentário político puro e duro. Senti algum deslumbramento na altura, cometi erros, mas sempre procurei ser sério e isento na minha opinião. Fiz parte dos “1%” de comentadores que criticavam José Sócrates e alertavam de que era um péssimo governante, vendedor de falsidades,numa fase em que ele era “o maior” e adorado por tudo o que é comentador e jornalista. Infelizmente, vivemos hoje uma situação semelhante com António Costa e os 3 partidos de esquerda e extrema-esquerda que apoiam o Governo. Eles são bons e tudo o resto é mau para “99%” dos jornalistas e comentadores, os quais têm o dever e a obrigação de ser sérios, isentos e profissionaismas, lamentavelmente, não o são.E porquê? Os seus empregos e avenças dependem disso? É porque é fácil estar do mesmo lado daquilo que é a propaganda dominante? Defendem os seus partidos preferidos? Qual a razão? Em parte, foi esta uma das razões que me levou a afastar do comentário político. Para sustentar as minhas afirmações, vamos aos factos pois estes são sempre melhores que meras opiniões:

A esquerda sempre teve necessidade de ter um fascista de serviço. Já foi o CDS-PP, agora é o Chega e André Ventura, apelidado de Populista. Entre diversas formas de o definir, populismo é por exemplo“ um termo utilizado na Ciência Política para explicar práticas associadas a governantes da América Latina durante boa parte do século XX”. Isto é, um “conceito que caracteriza o modocomo um político usa estratégias e recursos que têm como objectivo agradar e obter o apoioe a confiança dapopulação através de um discurso que é agradável a todos, no fundo sem desagradar a ninguém”. Ora quem na sociedade portuguesa se encaixa mais neste perfil? Diria que o Presidente da República surge em 1º lugar, seguido do actual Primeiro-Ministro e da líder do BE, que dizem tudo e o seu contrário para agradar aos eleitores. Não vejo André Ventura fazer isto, como também não o vejo despir-se e ir a banhos para a comunicação social filmar e divulgar, ou tirar fotografias a toda a hora com tudo e todos, ou António Costa com a questão da Galp e da refinaria de Matosinhos ou como a líder do BE com as IPSS (que tanto abomina e que quer exterminar) que as critica ao mesmo tempo que as defende quando lhe dá jeito atacar o Governo. Então, pergunto, porque razão há esta desonestidade de jornalistas e comentadores?Pub

BE e PCP são de extrema-esquerda e o Chega não é de extrema-direita (validado por investigadores ecientistas políticos). Então,porque razão jornalistas e comentadores abominam o Chega, dizendo que é um partido não democrático e de extrema-direita, e tratam como partidos democráticos e legitimam partidos “não democráticos” e de extrema-esquerda como o BE e o PCP? Porque razão a autoridade para a comunicação social não intervém perante manipulação e mentiras constantes? Quanto ao facto do Chega ser um partido não democrático, o Tribunal Constitucional já se pronunciou e se assim fosse o Chega já não existia. Alguém por acaso já ouviu André Ventura elogiar ou legitimar governos de países onde vigoram ditaduras, onde pessoas são presas e mortas apenas porque criticam os regimes dos seus paísestal como BE e PCP ao defenderem países como a Coreia do Norte? Ou quando gritam nas ruas votos de morte ao Presidente de um país irmão como o Brasil? Ou quando defendem regimes não democráticos socialistas/comunistas como a Venezuela e Cuba? Ou regimes e políticas que exterminaram milhões de pessoas? Onde está a isenção e a coerência de tais jornalistas e comentadores?

Mamadou Batem posições públicas que cabem na definição de umracista. É inacreditável como uma pessoa que promove o racismo está à frente de uma associação supostamente anti-racista e ainda recebe convites do Primeiro-Ministro para fazer parte de um grupo de trabalho contra o racismo. Já André Ventura não me parece racista, mais que não seja pelo simples facto de ter amigos e dirigentes partidários de raça negra na sua equipa (algo que um racista jamais faria). É certo que tem uma espécie de “fixação” com a comunidade cigana mas daí a ser racista vai uma enorme distância. Mais uma vez tudo é distorcido pela maioria dos órgãos de comunicação social.

Nas entrevistas,os jornalistas fazem perguntas incómodas e apontam incongruências no discurso a André Ventura (sobretudo a este) e a outros líderes de partidos de direita. Aliás, há 3 décadas que assim é: aos governos de esquerda tudo se perdoa; o escrutínio aos governos do centro-direita é enorme bem como a crítica fácil.No entanto, não procedem de igual forma com os líderes políticos da esquerda. Porquê? Jornalistas contribuem para a discussão de “não assuntos” como o destaque que foi dado à questão da prisão perpétua, em que de forma oportunista o Primeiro-Ministro aproveitou para fazer um vídeo que rapidamente foi colocado a correr nos órgãos de comunicação social, os quais lhe deram demasiado destaque, contribuindo assim para dar tempo de antena extra ao PS numa fase de pré-campanha (o que não devia acontecer, favorecendo,assim, o PS). Mas, mais grave ainda, é o Primeiro-Ministro ser convidado para dar 4 pseudo-entrevistas em talkshows da RTP, SIC e TVI numa fase de pré-campanha eleitoral a 3 semanas das eleições naquilo que considero um escandaloso favorecimento ao candidato do PS e actual Primeiro-Ministro (algo verdadeiramente ilustrativo daquilo que se passa numa qualquer ditadura).Pub

O BE tem candidatos condenados por terrorismo (das ex FP25 que roubaram e mataram pessoas) e a comunicação social questiona Rui Rio sobre a prisão perpétua (que se percebeu não é defensor) e André Ventura porque um seu dirigente disse um disparate qualquer, não fazendo o mesmo com os disparates e a demagogia dos partidos de esquerda. Há inclusive jornalistas a apelar directamente ao não voto no Chega. Ventura é acusado de ter um discurso fácil e demagogo; e os líderes da esquerda não têm? O Primeiro-Ministro não é demagogo quando falada semana de trabalho de 4 dias? Ou quando afirma que virou a página da austeridade em 2015, quando na realidade é desmentido pelos números do INE e EUROSTAT que demonstram que durante o seu governo existiram as maiores cargas fiscais de sempre e o menor investimento públicode sempre, inclusive comparando com aquele efectuado no tempo da Troika? Eu poderia dar mais exemplosmas o espaço é curto.

Por fim, como estamos em mês de eleições legislativas, tenho assistido aos debates políticos. É com perplexidade que vejo a necessidade da esmagadora maioria de jornalistas, politólogos e tudólogos (para quem não sabe são pessoas que comentam política, desporto e tudo o que calha) dizerem que Ventura perde os debates e que os outros candidatos é que ganham (sobretudo se são de esquerda). A um jornalista ou comentador aquilo que se pede é isenção, profissionalismo e seriedade. E não é isso que vejo, pelo contrário, o que vejo é que não conseguem despir a camisola da preferência política e, independentemente da realidade do que se assiste, Ventura perde sempre. Se os debates fossem um jogo de futebol até se podia dizer que uma equipa jogou melhor e perdeu, mas não é o caso.

Na minha opinião, Ventura ganhou os debates todos (com excepção do debate com Rui Tavares que diria deu um empate) e deixou imensamente nervosos, atrapalhados e sem argumentosos seus opositores(sobretudo a líder do BE). Os debates são muito pobres em ideias e propostas para o país e demasiado curtos. Por outro lado e em contraposição, há programas sobre futebol que ocupam horas diárias de espaço televisivo ou, pior, os comentários dos debates, que duram muito mais que os próprios debates, como se quisessem poupar a má governaçãoe o escrutínio dos partidos de esquerda e tentar orientar os eleitores a votar na esquerda. Até os intervalos, com demasiados anúncios, demoram quase o tempo dodebate, quando está em causa o acto de maior importância para um país – a eleição dos seus representantes Parlamentares e o Governo. Mas também nestes debates, os jornalistas têm culpa, porque fazem perguntas directas aos líderes dos partidos e estes fogem às questões discutindo muitas vezes assuntos sem relevância. Devia haver regras para isto, como por exemplo uma penalização do tempo para o líder que não respondesse a uma pergunta directa.Pub

Muito mais há para dizer mas o espaço deste artigo não é infinito. Fica aqui esta reflexão: muito gostaria que jornalistas e comentadores se auto-avaliassem e fizessem um esforço para serem verdadeiros profissionais e isentos, a bem da democracia e, já agora, da decência e do civismo. Um pouco de ética também não lhes ficaria mal. Convém não esquecer que a Democracia representa, acima de tudo, liberdade e igualdade.

José Bourdain, 10.01.2022

Os Portugueses têm direito à Verdade.

Os Portugueses têm direito à Verdade

Caros Compatriotas,

Gostava de partilhar convosco a minha análise sobre a situação que o nosso país vive. Podem discordar da minha opinião, (respeito, em democracia é normal e saudável haver opiniões diferentes), mas não duvidem dos factos que vos descrevo pois são totalmente verdadeiros e podem ser facilmente verificáveis.

Desde o início desta crise, o Governo tem demonstrado uma enorme incompetência e desorientação. Foi assim em muitas ocasiões, nomeadamente nos incêndios de 2017, e é agora nesta crise pandémica. Nada que surpreenda os mais atentos e com mais sentido crítico (livres de espírito, naturalmente). Isto resulta do simples facto de Portugal, contrariamente ao que acontece em muitos países democráticos, ter à frente dos seus cargos de decisão (políticos e da administração pública) as pessoas mais incapazes, mais incompetentes e mais mal preparadas (com poucas excepções). Não fossem as amizades, e os favorecimentos políticos, estas pessoas, que tomam decisões importantes para a vida de todos os portugueses, estariam provavelmente desempregadas.

Sobre a desorientação já se escreveu alguma coisa (são poucos os que têm coragem de o fazer) e eu gostaria de acrescentar alguns exemplos na primeira pessoa.

No dia 13 de Março de 2020, recomendava o Governo, e a DGS, que não houvesse visitas a Lares de Idosos. Nenhuma palavra sobre Unidades de Cuidados Continuados Integrados (UCCI) nem tão pouco Lares para Pessoas com Deficiência. As instituições que têm este tipo de valências não sabiam o que fazer. Eu, de imediato, dei indicações na minha instituição para não permitir visitas a partir desse fim-de-semana. No meio da desorientação, o nosso Governo não se lembrou de recomendar que se deveria testar todo e qualquer doente que saísse de um hospital para entrar numa UCCI ou Lar. A falta deste teste contribuiu para o elevado número de pessoas infectadas que se seguiu. Foi a ANCC – Associação Nacional dos Cuidados Continuados, que enviou um e-mail às Senhoras Ministras da Saúde e da Segurança Social a alertar para tal situação. Felizmente aceitaram a nossa sugestão e passaram a testar a maioria dos doentes (não todos, ao contrário do que Ministra da Saúde diz nas conferências). Posteriormente, foi a desorientação com pessoas infectadas em Lares, com profissionais a fugirem e idosos a ficarem sozinhos sem ninguém que cuidasse deles. Novamente, a ANCC enviou um e-mail às Senhoras Ministras com diversas sugestões de procedimentos importantes, nomeadamente formas de organização dos profissionais, avisando do óbvio: que se tal situação se mantivesse não haveria hospitais militares (e outros) para receber tantas pessoas. Mais uma vez, felizmente, aceitaram as sugestões da ANCC.

Na ANCC, temos estado, sempre, vários passos à frente das orientações do Governo/DGS (aliás, tal como a maioria das Câmaras Municipais como é o exemplo daquela onde vivo e trabalho – Sintra), porque sabemos mais do que os que nos governam, o que remete para o início deste artigo, de que somos governados pelos mais incompetentes e incapazes. A única coisa que a ANCC pediu ao Governo (dia 17 de Março de 2020, ao Sr. Secretário de Estado da Saúde, que nos disse que “ia tratar”) e que não aconteceu até à data, foi fazer-nos chegar material de protecção para podermos fazer o nosso trabalho. Desde esse dia também, informei todas as Associadas da ANCC que estávamos por nossa conta e que não esperassem nada do Governo, o que, até à data, também se verifica.

Governo, este, que é exímio na propaganda. Nisso, infelizmente, eles são bons. Tal como nos incêndios de 2017, o Governo voltou a montar uma operação de propaganda e de contra-informação que só tem paralelo com países como a China, a Rússia e a Venezuela. É idas do Primeiro-ministro a programas de entretenimento e entrevistas a jornais e televisões de que “nada falta no SNS”; entrevistas à Ministra da Saúde de como passa os dias; directos televisivos de chegadas de aviões; número de testes feitos diariamente. No fundo, tudo aldrabices atrás de aldrabices com a cobertura da quase totalidade dos órgãos de comunicação social que são uma espécie de escudo protector dos governos de esquerda em Portugal. Eu próprio tenho sentido a forte censura. Tenho sido contactado por alguns jornalistas de Rádios, Jornais e Televisões que me pedem para comentar a actualidade mas que depois, ou não passam rigorosamente nada, ou cortam grande parte do essencial que pretendo transmitir, razão pela qual o faço agora neste artigo, precisamente neste órgão de comunicação social livre, que não censura, onde, por isso, escrevo há já vários anos.

Censura que também sofrem os Presidentes de Câmara (que perante a lei são a autoridade de protecção civil máxima) neste Estado de Emergência, ao verem o Governo sonegar-lhes informação de que precisam para fazer bem o seu trabalho.

Passa-se uma imagem para os portugueses, e também para fora de Portugal, de que somos muito bons e que o Governo agiu muito bem e que, por essa razão, estamos muito melhor que a generalidade dos países. Nada mais falso! Com a conivência da maioria dos órgãos de comunicação social, usam-se percentagens quando se deviam usar números. Por exemplo: se passamos de 10 para 20 casos, não é assunto. Se, de 7 para 8 de Abril, passamos de 12.442 para 13.141, ou seja +699 casos, a subida é de 5,6%, desta forma dá-se a sensação que estamos com muitos poucos casos pois sistematicamente focam-se na percentagem. Já quando nos comparamos com outros países fazemos a comparação por número de casos. No entanto, e de uma forma séria, deveríamos fazer a comparação por percentagem de casos face ao número de habitantes, só assim a comparação faz sentido e aí Portugal é o 8º pior a nível mundial (veja aqui https://www.statista.com/chart/21176/covid-19-infection-density-in-countries-most-total-cases/). No entanto, comparamos uma população de 10 milhões com países com população 4, 5, 8, 10 ou mais vezes superior à de Portugal e aí, obviamente, o número de casos em Portugal é, manifestamente, inferior. Ou seja, vale tudo no encobrimento do enorme falhanço do Governo face a esta pandemia. E os números em Portugal só não são piores porque não foram feitos mais testes. Outra farsa é na ênfase da diminuição de pessoas em Cuidados Intensivos (CI). É mais que óbvio (mas não é propositadamente explicado) que se o número de pessoas em CI baixou em 2 e se morreram 40 pessoas é porque provavelmente morreram 40 que lá se encontravam e entraram 38. Mas nada se explica, talvez para esconder que somos dos países da Europa e OCDE que menos camas tem em cuidados intensivos face à população existente.

Importa ainda não esquecer, nem escamotear, que o primeiro caso de Covid-19 em Portugal surgiu um mês depois do primeiro caso em Espanha.

Se as coisas em Portugal não estão piores isso deve-se, sobretudo, ao facto de sermos um país mais pobre e ao factor sorte. Como os portugueses são pobres viajam menos; como temos uma fraca economia os empresários viajam menos, logo menor número de casos e como recebemos poucos turistas chineses (ao contrário de Espanha e de Itália), logo menor número de casos. São precisamente os países mais ricos e mais desenvolvidos que estão pior, ou alguém acha que isto é coincidência? Acresce ainda o facto de sermos periféricos e fazermos fronteira apenas com um país. E, por fim, tal como se tem vindo a demonstrar, porque, ao contrário de Espanha e Itália, Portugal tem uma Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (constituída por entidades privadas com e sem fins lucrativos) e são estes que têm tido o melhor desempenho no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Embora me custe dizê-lo pelas mais variadas razões, o país deve isso ao Governo de José Sócrates.

No início da Crise, e após Espanha anunciar que ia lançar 200 mil milhões de euros (perto de 20% do seu PIB anual), Mário Centeno deu uma conferência de imprensa a anunciar que ia lançar medidas de cerca de 19% do PIB trimestral. Não houve um único jornalista a confrontar o Ministro das Finanças com o facto de que 19% de um trimestre equivale a quatro vezes menos que o ano todo (um ano tem 4 trimestres como todos sabem). Ou seja, o Ministro anunciou medidas que valem cerca de 4,5% do PIB anual. Mais uma vez, uma aldrabice com a conivência da comunicação social.

O Governo anunciou 50 milhões de euros de reforço ao Sector Social (mais uma vez os Cuidados Continuados ficaram de fora). O número parece impressionante, mas não deixam de ser trocos que nem sequer cobrem o aumento do Salário Mínimo Nacional.

O nosso chefe de Governo tem-se desdobrado em comunicados de imprensa, entrevistas a televisões, rádios e jornais, tudo em nome da propaganda e da popularidade, apenas e só para disfarçar o óbvio: o país estava, e está, muito mal preparado para responder à mínima crise de Saúde/Social devido ao desinvestimento nestes sectores. Razão pela qual, e aconselho os leitores a reverem o comunicado ao país, António Costa, o grande vendedor da banha da cobra, se dirigiu ao país no dia 20 de Março 2020 e parecia em tudo (até no tom de voz) o comunicado ao País de Sócrates quando este anunciou a bancarrota em 2011. Ou seja, não tinha nada para dizer nem nada para oferecer, parecia completamente perdido.

Estas são as razões mais directas para o falhanço do Governo perante esta pandemia. Mas, então, e as outras razões, as que vêm das más políticas, das más decisões do passado que contribuíram, e muito, para chegarmos a este ponto? Deixem que vos enumere as principais:

1. A principal razão, e mais óbvia de todas, é o enorme desinvestimento no SNS ao longo destes últimos anos de Governo PS (não esquecer que com o apoio do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista). Quase diariamente surgiam notícias de Maternidades encerradas, bem como urgências pediátricas e tantos outros serviços, por falta de recursos humanos, mas também de equipamentos avariados, ao que se acrescenta edifícios e mobiliário a cair aos bocados. Situação ainda agravada com a passagem dos profissionais de saúde para 35 horas de trabalho por semana, que criou um enorme vazio no SNS. Basta ver que em 2020 se gasta menos no SNS do que em 2008 quer em percentagem do PIB quer em valores absolutos. Os profissionais, apesar da redução de horário e aumento de salário, andam desmotivados pois não têm condições para trabalhar.

2. O Governo, aos poucos, tem destruído o Sector Social, onde se incluem precisamente os Lares de Idosos, mas também as Unidades de Cuidados Continuados e os Lares para Pessoas com Deficiência, entre outros serviços a idosos, deficiência e infância.

a. O Governo impôs um brutal aumento de custos a este sector (sobretudo aumentos sucessivos do Salário Mínimo Nacional e Taxa Social Única) sem depois compensar na receita com os valores que o Estado paga. Isto faz com que as Instituições não tenham as condições físicas, materiais e, principalmente, de recursos humanos suficientes para funcionar condignamente.

b. Não existem, no mercado de trabalho, pessoas suficientes para trabalhar neste sector. Faltam sobretudo enfermeiros, auxiliares de acção médica, auxiliares para trabalhar com idosos/deficiência, pessoal de limpeza, lavandaria, cozinha e também motoristas. No Verão, esta situação nota-se mais com os serviços a funcionarem de forma deficiente pois os profissionais vão de férias e não há mão-de-obra para os substituir.

c. Muitas destas Instituições têm profissionais que não são qualificados e alguns deles carecem de princípios éticos e humanos para estarem a trabalhar com pessoas em situação “frágil”. No entanto entre ter estes e não ter nenhuns, vão mantendo maus profissionais pelo simples facto, reforço, de que não há alternativa no mercado de trabalho. Acresce os problemas destes trabalhos serem mal remunerados e ainda de termos uma má legislação de trabalho que apenas protege os maus e os incompetentes.

d. O Governo transformou as UCCI em hospitais baratos e transformou os Lares em UCCI de 2ª categoria. Actualmente, os Lares têm muitos idosos que precisam de muitos cuidados médicos e de enfermagem mas o Governo não os quer pagar, por isso o Governo não exige que os Lares tenham estes profissionais. Esta é a razão pela qual se tem assistido à impreparação (natural) de quem trabalha nestes Lares para lidar com esta Pandemia conforme tem sido realçado, e bem, por vários Presidentes de Câmara e de Instituições que detêm Lares. Teimosamente, o Governo e a DGS tentam culpabilizar os Lares por “não terem planos de contingência”, furtando-se, desta forma, às suas próprias responsabilidades.

e. Muitas UCCI, Lares de Idosos e Deficiência têm salários em atraso, dívidas a fornecedores e à banca. Às dificuldades naturais em contratar recursos humanos acresce esta dos salários em atraso. Muitos, porque estão em falência técnica, tentam reduzir os custos o mais possível, nomeadamente através da contratação de recursos humanos a recibo verde (a rotatividade de profissionais neste sector é elevadíssima, resultando em grandes problemas) mas também desligando as Unidades de Tratamento de Ar (UTA) para pouparem custos com electricidade e manutenção dos equipamentos (as escolas fizeram o mesmo, lembram-se da “FESTA” da Parque Escolar no tempo de José Sócrates?). Numa Pandemia, faz muita diferença estas UTA estarem ligadas.

f. Estas Instituições perderam muitos profissionais de saúde para o sector público por força do buraco criado com a redução para as 35 horas (o Presidente da República afirmou que ia estar atento caso esta medida trouxesse aumento de custos no Orçamento de Estado – trouxe! E nada fez quanto a isso), situação que levou o Governo a contratar milhares de enfermeiros (que não haviam no mercado de trabalho). Muitos emigraram e outros, que estavam nestas Instituições, fugiram para o Estado, que paga melhor, oferece mais regalias e onde se trabalha menos cinco horas por semana (além de que, assim, muitos destes profissionais podem sempre ir trabalhar umas horas extra fora do hospital).

g. O Governo e o Presidente da República choram lágrimas de crocodilo com o drama que se vive nos Lares de Idosos (mais uma vez ambos esquecem a Deficiência e os Cuidados Continuados) mas durante cinco anos nunca quiseram saber (nem a generalidade dos órgãos de comunicação social) dos graves problemas que ali se viviam e dos vários alertas que a ANCC e eu próprio lhes fizemos chegar. Desde que a ANCC existe (Julho de 2017), nem o Governo nem o Presidente da República nos receberam nem quiserem visitar as nossas Instituições, o que demonstra bem a preocupação com os Cuidados Continuados. É pois repugnante verificar que, mais uma vez, fazem números televisivos fingindo que se preocupam. Nestas estruturas de apoio social, não existem as melhores condições para os idosos terem um final de vida condigno precisamente porque o Governo não quer gastar dinheiro para que estes tenham qualidade de vida. Dar alimentação, fazer higienes e sentar um idoso num sofá a ver televisão é muito pouco digno para um final de vida. Mas, infelizmente, o Governo nem dinheiro suficiente dá para os mínimos.

h. Mal tomou posse, há 5 anos, o Governo deu um enorme bónus ao sector da hotelaria e restauração ao baixar o IVA de 23% para 13% perdendo uma receita anual entre 350 a 400 milhões de euros (e engordando os lucros aos empresários deste sector). Este era um sector que não precisava de apoio pois estava em forte crescimento. Em contrapartida, ao Sector Social e da Saúde foram só cortes. Que diferença para todos fariam estas centenas de milhões se fossem canalizadas para o Sector Social e da Saúde! E que dizer do IVA da electricidade estar nos 23%, comparando com a restauração, quando muitos idosos em Portugal morrem de frio por não terem dinheiro para se aquecer?

i. O Governo tem causado miséria ao Sector Social/Saúde com a conivência do Presidente da República mas também com a conivência da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS) e da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), as quais não defendem os interesses dos seus associados e assinam de cruz tudo o que o Governo lhes põe à frente, e sem reclamar e denunciar publicamente do muito que não é cumprido nos compromissos assinados.

3. O Governo, depois de passado o período da Troika, não investiu em novos equipamentos sociais/saúde. A última vez que tal aconteceu foi em 2009 e apenas na Região de Lisboa e apenas na área da deficiência, através de fundos comunitários (POPH). Ou seja, mais de 11 anos sem se investir numa Creche, num Centro de Dia ou Lar para Idosos e em Unidades de Cuidados Continuados. E muitas famílias sentem isto na pele porque nos poucos existentes não há vagas.

Comecei o artigo por dizer que somos governados pelos mais incapazes. Mas estes são apenas os segundos maiores culpados. Os maiores culpados disto tudo são os eleitores portugueses que, tendo a oportunidade de castigar os maus governantes e de dar uma oportunidade a outros, simplesmente não o fazem (por distracção, conivência ou interesses), não castigam nas urnas quem já levou o país à falência por três vezes. Ou porque votam no Partido Socialista e em partidos não democráticos, dos quais destaco os radicais e extremistas do Bloco de Esquerda (cuja política é quanto mais sangue, miséria e anarquia melhor) ou porque optam por ficar em casa e não ir votar. O Partido Socialista, que nos tem Governado na esmagadora maioria dos anos em que vivemos em “democracia”, é o maior culpado desta má Governação. Se os eleitores os castigassem a sério (como outros povos fizeram a partidos que muito mal governaram os seus países), e desta forma este partido tivesse pouca expressão, este seria obrigado a renovar-se e certamente iriam emergir os bons elementos do Partido Socialista (que os há, e muitos, alguns até conheço pessoalmente) e com isso a sociedade certamente ficaria melhor.

Por fim, depois de passar esta crise, o Governo, caso tenha o mínimo de vergonha e decência, devia demitir-se e pedir perdão aos portugueses por lhes dar tão más condições de vida, nomeadamente através do Serviço Nacional de Saúde e do Sector Social e por ter permitido que o nosso país chegasse à situação actual. Sei que tal não irá acontecer, infelizmente, pois são como lapas agarradas ao poder (sempre assim foi); bem como os partidos de extrema-esquerda não irão contribuir para derrubar o Governo pois pactuaram e pactuam com este estado de coisas há cinco anos. Esta seria, certamente, a melhor solução a curto prazo para que viesse alguém competente e tirasse o país desta crise. No entanto a médio/longo prazo talvez até seja bom o PS governar em tempos de austeridade (que vamos ter pela frente). Talvez isso ajude muitos portugueses a “abrirem os olhos” e a não se deixarem enganar por este Governo.

Exigia-se, perante estes acontecimentos todos, que, o Senhor que ocupa o cargo de Presidente da República, uma única vez em cinco anos (não seria pedir muito) dignificasse o cargo e tivesse um acto político de registo (que não apenas ser notário do Governo) o qual seria dissolver o Parlamento e convocar eleições legislativas. E no minuto seguinte, que escrevesse a sua própria carta de demissão, para que também os portugueses escolhessem um verdadeiro e efectivo Presidente da República, e que de seguida fosse para casa cozinhar e tratar da roupa e deixasse a política para os homens e mulheres com verdadeiro sentido de Estado. Infelizmente não vai fazer nem uma coisa nem outra. E é difícil demitir um Presidente…, além de que não acredito que exista coragem para tal.

Por falar em sentido de Estado, a minha homenagem e um agradecimento ao melhor Primeiro-Ministro que Portugal já teve – Pedro Passos Coelho – e que, com a sua liderança e perseverança, conduziu com sucesso os destinos de Portugal no meio de um enorme furacão, também mundial. Tanto jeito que nos dava tê-lo como Primeiro-Ministro na fase que estamos a atravessar. Aproveito ainda para lhe apresentar um sentido e humilde pedido de desculpas por um artigo de opinião que fiz neste jornal (quando surgiu como candidato à liderança do PSD) pois errei na avaliação que lhe fiz.

Termino advertindo para alguns assuntos para os quais lanço alertas desde há vários anos. O país deveria preparar-se para viver situações como:

1. Falta de água. Deveria construir-se, em zonas estratégicas, diversas centrais de dessalinização de água e criar uma segunda rede de abastecimento para separar a água potável das águas sanitárias.

2. Auto-suficiência alimentar. Portugal importa mais de 70% dos alimentos que consome. Temos de investir nesta área porque basta que haja uma explosão solar mais forte, um vulcão que entre em erupção ou outra catástrofe natural, para que o país passe fome.

3. Desertificação e consequências desastrosas dos incêndios. Temos de implementar uma política séria de repovoamento e reflorestação do território.

Caros compatriotas,

Desejo fortemente que passem a dar mais atenção aos candidatos a detentores de cargos políticos, que os avaliem melhor para que, quando neles votarem, saibam bem separar entre os verdadeiros líderes, honestos e competentes e os vendedores de banha da cobra e os ratos que se escondem quando aparece a primeira dificuldade séria! Desejo que sejam mais exigentes com quem vos governa e com os serviços públicos em geral.

O país precisa dos melhores e dos mais competentes a tomar decisões e a construir alternativas a este estado de coisas. E todos temos de trabalhar para que isso aconteça.

Obrigado pela atenção que dedicou a este texto.

José Bourdain, 14.03.2020

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